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Os (meus) melhores filmes de 2017


Não, eu não consegui passar de 100 filmes assistidos em 2016 e estou atribuindo isso e todo o mau aproveitamento do meu tempo livre ao videogame.

Apesar disso, foi razoavelmente difícil eleger meus filmes favoritos do ano (independente da data de lançamento). Foi muita coisa boa. Ao mesmo, sinto que serei apedrejada por alguns por causa do ranking. Bom, mas se nem Jesus agradou a todos, imagina eu, que nem me esforço mais.

(peço apenas que deixemos de lado a minha pequena trapaça, porque terminei de ver os filmes que queria no dia primeiro de janeiro. Mas foi só um diazinho a mais. O que importa é que eu tinha me programado pra assistir até dia 31 – o famoso "o que vale é a intenção"e autodenúncia desnecessária)



15. OKJA, de Bong Joon-ho, 2017 | Trailer

Do diretor de Expresso do amanhã e de dois filmes que quero muito ver e ninguém está interessado em saber mas vou dizer mesmo assim - O hospedeiro e Memórias de um assassino -, Okja acompanha a história de amizade entre Mija (rs) e Okja, um superporco gigantesco meio que criado artificialmente (não lembro porque faz tempo que assisti, Brasil), otimizado pra servir de alimento, revolucionando a pecuária global. Uma empresa multinacional quer produzir 'Ojkas' em série pra ganhar muita grana, mas o problema com esse bicho em especial é que Mija vai fazer de tudo pra que sua BFF continuar viva, do seu lado.

Produção original Netflix com Crítica Social Foda® - conscientização sobre consumo de animais, industrialização em massa, capitalismo desenfreado -, um elenco importante (Tilda Swinton, Paul Dano e Jake Gyllenhaal estão nele, mas a garotinha que faz Mija rouba a cena muitas vezes) e um uso de CGI bem bacana!

Curiosidade: uma amiga bem próxima parou de comer carne depois de assistir ao filme. Não é lenda urbana, essas pessoas existem.


14. UM LIMITE ENTRE NÓS, de Denzel Washington, 2016 | Trailer

Pra começar, ele deveria se chamar CERCAS, como no original, que tem muito mais a ver com o filme e com seus simbolismos.

Dirigido e atuado por Denzel Washington, a história baseada na aclamada e premiada peça teatral homônima segue o dia a dia de um jogador de beisebol aposentado, que sonhava em se tornar um grande jogador durante sua infância e agora trabalha como coletor de lixo para sobreviver. Ele terá de navegar pelas complicadas águas de seu relacionamento com a esposa, o filho e os amigos.

Contando com poucos cenários, Um limite entre nós Cercas se ancora num roteiro sensacional, repleto de diálogos fortes (verborragia corre solta), e em atuações marcantes de personagens reais e complexos. Viola Davis está maravilhosa. A vida nem sempre (ou, talvez, quase nunca) segue aquilo que um dia traçamos e é mais dura do que gostaríamos, mas quando estamos rodeado de quem amamos, pode ser mais fácil caminhar.


13. THELMA, de Joachim Trier, 2017 | Trailer

O candidato da Noruega ao Oscar 2018 (mas que não deve ser selecionado) busca apresentar a descoberta sexual e social de Thelma, uma jovem tímida e reprimida que deixa a casa dos pais para estudar em Oslo, onde vive seu primeiro amor. No entanto, essa experiência é logo afetada pela intromissão opressiva de sua família e de suas crenças religiosas. O negócio é que, quando Thelma fica muito chati, fenômenos sobrenaturais como pássaros morrendo e luzes piscando começam a acontecer e terminam em convulsões.

Thelma é uma fábula de terror psicológico sobre a autodescoberta. Ares de Carrie, A Estranha, uma pegada original, uma fotografia fria e pesada, metáforas sobre nossos medos, liberdade, desejos e uma atuação que me encantou completamente de Eili Harboe, quem interpreta a protagonista.


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12. EU, DANIEL BLAKE, de Ken Loach, 2016 | Trailer

Já falei desse filme de ARREGAÇAR o coração em um outro post de indicações.

Vencedor da Palma de Ouro de 2016, o filme acompanha Daniel, que, após sofrer um ataque cardíaco e ser desaconselhado pelos médicos a retornar ao trabalho, busca receber os benefícios concedidos pelo governo a todos que estão nesta situação. Entretanto, ele esbarra na extrema burocracia instalada pelo governo, amplificada pelo fato dele ser um analfabeto digital. Numa de suas várias idas a departamentos governamentais, ele conhece Katie, mãe solteira de duas crianças, que se mudou recentemente para a cidade e também não possui condições financeiras para se manter.

Eu, Daniel Blake é o retrato real, cru e tocante de como o governo pode massacrar a vida da população mais carente. Mesmo com vários momentos ternos, até engraçados, ele choca ao nos colocar na posição de quem se sente como uma estatística, e não como ser humano, diante daquele que deveria nos amparar. Tem uma cena tão, mas tão desesperadora que eu demorei uns cinco minutos no cinema pra retomar o ar – e nem foi no final.


11. EU, TONYA, de Craig Gillespie, 2017 | Trailer

(Esses títulos de filme estão cada vez mais originais)  

Craig Gillespie, responsável pelo queridinho cult A garota ideal, traz a história real da patinadora artística Tonya Harding, que ficou famosa mundialmente por ter sido a primeira mulher americana a completar o axel triplo em competições e por um incidente que acabou com sua carreira. Como ela mesma diz, em um minuto era amada pelo público e, no outro, odiada.

Glória e decadência se misturam nesse filme que, apesar de pisar em terreno pesado, como violência doméstica, é divertido, irreverente e mostra uma perspectiva que o mundo não conhecia (ou não conhecia muito bem até então): a da dura vida de Tonya, que, no fim das contas, só queria ser amada de verdade. Terminei de assistir sentindo uma grande compaixão por essa pessoa.

(Tenho até vergonha de dizer, mas Margot Robbie está ótima aqui e eu achava que ela era só aquela loira-Barbie que põe um salto na testa no Leonardo DiCaprio em O lobo de Wall Street e fez a Arlequina de Esquadrão Suicida)


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10. AO CAIR DA NOITE, de Trey Edward Shultz, 2017 | Trailer

Também já fiz um texto todinho só pra ele, aqui.

Ao cair da noite nos convida a acompanhar uma família composta por Paul, Sarah e Travis, que tenta sobreviver em um mundo pós-apocalíptico em que a população está sendo dizimada por causa de uma misteriosa doença altamente contagiosa. Para se protegerem, eles usam máscaras de gás, trancam as portas e janelas da casa que transformaram em lar, sempre saem em dupla e nunca, nunca saem à noite, exceto em casos de extrema urgência. Mesmo com pouca comida e água, tudo vai relativamente bem até que a ordem preestabelecida entre os três é abalada com a chegada de um homem, Will, que pede abrigo ao provar que não está contaminado.

Eis um belo trabalho de construção de clima onde o que mais importa é a viagem, e nem tanto o destino, sob o ponto de vista do espectador. Paranoia e apreensão constante de que algo aconteça dão o tom, como um bolha esperando ser estourada. O que está lá fora? Will está sendo sincero? Ele está escondendo alguma coisa? Por quê?


9. A GAROTA DE FOGO, de Carlos Vermut, 2014 | Trailer

MANO DO CÉU. Se prepara pra desgraçar a cabeça.

Em A garota de fogo, também conhecido como Magical Girl, personagens de realidades diferentes se encontram, dando sequência a acontecimentos que vão transformar suas vidas.

Alicia é uma criança doente que sonha com o vestido da série japonesa "Magical Girl Yukiko". Luis, seu pai, fará de tudo ao seu alcance para consegui-lo. Durante sua busca, seu destino se cruza com Bárbara, uma jovem atraente e com transtornos mentais, além de Damián, um professor aposentado que possui um passado conturbado. Luis, Bárbara e Damián ficarão envolvidos em uma obscura teia de chantagens, onde instintos e razão serão testados em uma luta trágica.

Esse é o tipo de filme que eu preciso levar uns dias pra absorver e avaliar. Ou seja, você não vai se esquecer fácil dele. Enigmático e chocante demais. Bárbara Lennie, que mulherona da porra.


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8. MOONLIGHT, de Barry Jenkins, 2016 | Trailer

Também falei dele aqui.

Vencedor do Oscar do ano passado em um dos momentos mais vergonhosos e marcantes da premiação, em que consagraram por engano La la land como Melhor Filme, Moonlight é uma jornada bastante intimista de seu protagonista, Chiron, dividida em três fases de sua vida – infância, adolescência e idade adulta –, em que ele luta para construir sua identidade e sexualidade em uma sociedade extremamente machista e violenta. 

Moonlight é um filme de silêncios: as expressões faciais e corporais dos personagens conseguem falar mais do que várias linhas de diálogos. A dor da solidão foi lindamente descrita com aquilo que mais a caracteriza – ausências. E, socialmente falando, Moonlight também é um filme importante. Uma viagem poética pelo autoconhecimento. É, acho que gosto muito de obras assim, como já devem estar percebendo, principalmente porque o próximo da lista se encaixa nisso.


7. ME CHAME PELO SEU NOME, de Luca Guadagnino, 2017 | Trailer

Eita filme que chamou a atenção de todo mundo no ano passado. Fortíssimo candidato a várias categorias do próximo Oscar, Me chame pelo seu nome é baseado no livro homônimo de André Aciman e acompanha o sensível Elio, único filho de uma família americana com ascendência italiana. É verão, e ele passa seus dias entre tomar banho de piscina, pegar um solzinho, ler, tocar piano, roubar frutas do pomar da propriedade e pedalar pelas belas e lânguidas paisagens do norte da Itália (próximo destino que você vai querer incluir nas suas férias). Até que, um dia, esse marasmo é interrompido pela chegada de Oliver (Armie Hammer, dono da voz masculina mais sensual do mundo), um acadêmico que veio ajudar a pesquisa de seu pai.

Como disse ali em cima, o florescer da sexualidade. Hormônios a mil. A euforia e a decepção que vêm com o primeiro amor. O ritmo é bem lento, mas é preciso ter sensibilidade para assimilar a delicadeza com que é levado o desenvolvimento da dinâmica entre Elio e Oliver. A cena final de uma conversa entre Elio e o pai é, pra mim, o ápice do filme. Eu poderia até apostar que, se não fosse pela atuação estupenda de menino Timothee Chalamet, Me chame pelo seu nome não seria a mesma coisa. 

Ah, e você nunca mais vai olhar um pêssego da mesma maneira.


6. MANCHESTER À BEIRA-MAR, de Kenneth Logernan, 2016 | Trailer

Um filme de corações quebrados pra quebrar aquele que bate no seu peito. :3

Acho que esse também é um caso de "se fosse outro ator, não seria a mesma coisa". Por mais que Casey Affleck seja considerado embuste por muita gente por ter sido acusado de assédio sexual anos atrás, não dá pra negar que o trabalho dele foi incrível. Em Manchester à beira-mar ele é Lee Chandler, uma espécie de faz-tudo do pequeno complexo de apartamento onde vive, no subúrbio de Boston. Ele passa seus dias tirando neve das portas, consertando vazamentos e fazendo o possível para ignorar a conversa de seus vizinhos. Em suas noites vazias, Lee bebe cerveja no bar local e arruma confusão com qualquer um que lhe lançar um olhar. Quando seu irmão mais velho morre, ele recebe a desagradável surpresa de sua nomeação como tutor de seu sobrinho. De volta à sua cidade natal, ele terá que lidar com memórias queridas e dolorosas.

Não dá pra dizer muito mais que isso da sinopse porque o espectador precisa ir descobrindo aos poucos porque Lee se transformou em alguém amargurado, atormentado e completamente despedaçado. Um drama pesadíssimo que explora como a dor pode ser capaz de paralisar alguém.


5. ANIMAIS NOTURNOS, de Tom Ford, 2016 | Trailer

🌼 ESNOBADINHO DO OSCAR 2017 🌼

Susan é uma negociante de arte que se sente cada vez mais isolada do parceiro. Um dia, ela recebe um manuscrito de autoria de Edward, seu primeiro marido. Por sua vez, o trágico livro acompanha o personagem Tony Hastings, um homem que leva sua esposa e filha para tirar férias, mas o passeio toma um rumo violento ao cruzar o caminho de uma gangue. Durante a tensa leitura, Susan pensa sobre as razões de ter recebido o texto, descobre verdades dolorosas sobre si mesma e relembra traumas de seu relacionamento fracassado.

Animais noturnos é um filme que diz muito mais do que o que você simplesmente vê em tela. Uma história sobre vingança que utiliza paralelamente três linhas do tempo pra conclui-la, cheias de metáforas e simbolismos reforçados por uma escolha acertada da paleta de cores, reflexos de enquadramentos em cada realidade, um roteiro muito bem escrito e um elenco afiado. Cada vez que penso em suas camadas, mais eu gosto dele.   


 4. MÃE!, de Darren Aronofsky, 2017 | Trailer

NÃO SENTA NA PIA NÃO CHUMBADA!

Um dos filmes mais controversos do ano passado, mãe! possui uma sinopse até convencional: um casal vive em um imenso casarão no campo. Enquanto a jovem esposa passa os dias restaurando o lugar, afetado por um incêndio no passado, o marido mais velho tenta desesperadamente recuperar a inspiração para voltar a escrever os poemas que o tornaram famoso. Os dias pacíficos se transformam com a chegada de uma série de visitantes que se impõem à rotina do casal e escondem suas verdadeiras intenções.

Porém, de convencional a trama não tem nada, né, mores que assistiram? Talvez vendido erroneamente como uma espécie de filme de suspense/terror psicológico, mãe! é um graaaande emaranhado de alegorias que, uma vez que você desvenda, elas se encaixam brilhantemente no que está sendo visualmente mostrado. Eu já fiz um textão a respeito, aqui.


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3. LA LA LAND, de Damien Chazelle, 2016 | Trailer

É AGORA QUE O CIRCO PEGA FOGO

Que que eu posso fazer se o seu amooooor me pegoooou cê bateu tão forte com o teu amoooor

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YUQUEEEEEEEE
Que me desculpem os haters, mas eu sou completamente apaixonada por La la land e nunca canso de assistir. Saí do cinema dançando e me pendurando em postes de iluminação. A trilha é uma delícia (inclusive estou ouvindo-a neste momento). As cenas cômicas são uma delícia. Tudo é gostosinho demais. Eu quero rodar meu vestidinho amarelo com a Emma Stone no meio da rua.

A história do filme une as histórias do pianista de jazz Sebastian e da atriz iniciante Mia, que se apaixonam perdidamente na cidade onde todos os sonhos são possíveis: Los Angeles. Em busca de oportunidades para suas carreiras na competitiva cidade, os jovens tentam fazer o relacionamento amoroso dar certo. Sebastian é branco e quer salvar o jazz porque ninguém mais escuta? FODA-SE. Ryan Gosling é estrábico e não tem o potencial vocal de um tenor? FODA-SE. Existem musicais muito melhores que La la land? SIM, E DAÍ, ALGUÉM TÁ FAZENDO COMPETIÇÃO??

(reajo muito passionalmente a coisas que amo)


2. LADY BIRD, de Greta Gerwig, 2017 | Trailer

SEGURA QUE ESSA PASSARINHA VAI VOAR MUITO NO OSCAR
A PERIQUITA NÃO PRECISA SEGURAR

Incrível como a A24 só tem trazido filme bom ultimamente. Você sabe quem é Greta Gerwig? É uma gostosona talentosa quatro anos mais velha que eu e quem eu gostaria de ter sido na casa dos 20: roteirista foda, diretorzona da porra e atrizona (se bem que nunca sonhei em ser atriz), responsável por aquela pérola chamada Frances Ha. Acho que, acima de qualquer torcida no próximo Oscar, torço pra que ela receba ao menos uma indicação como Diretora. Seria incrível ver uma mulher indicada, coisa que acontece mais ou menos a cada passagem do Cometa Harley.

 A história se passa em 2002: a estudante Christine "Lady Bird" está no último ano do colégio e não faz ideia do que fazer depois que se formar. A convivência com sua mãe, uma enfermeira, é sufocante. Tudo o que vai acontecendo na vida de Lady Bird só a deixa cada vez mais desnorteada. E sim, a sinopse é bem "assim" porque o "tudo que vai acontecendo" são coisas comuns na vida de todo adolescente que está tentando amadurecer, e a protagonista vai entender das formas mais conflitantes que amadurecer não é um conto de fadas. Que roteiro, Greta. Caralho, eu tenho 30 anos e me identifiquei demais com esse filme. Melhor coming of age que assisti há eras (desde Quase 18).

(eu até sugiro que você não assista ao trailer e vá direto assistir ao filme)


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1. A GHOST STORY, de David Lowery, 2017 | Trailer

Mais um belo fruto do estúdio A24. Não suporto ouvir alguém dizer que não gostou desse filme.

Quando terminei A ghost story, eu sabia não só que seria difícil algum outro longa ser superior a ele no meu ano, como sabia que ele tinha entrado pra minha mais ou menos seleta lista de filmes favoritos da vida. A ghost story me tocou de forma ABSURDA, a ponto de um nó se criar na minha garganta quando revejo o trailer.

É uma história de um morto assombrado pela vida. Um homem que se vai e retorna para o seu lar em forma de um fantasma, desses de pano branco, para tentar se reconectar com sua esposa que ainda mora lá. Aquela velha ideia de contos de fantasmas, geralmente sob a ótica do terror, é subvertida aqui em uma visão emocionante, sensível e angustiante dentro do molde clássico do espírito atormentado e apegado a um determinado lugar. Uma poesia esplêndida sobre a existência e sobre a grandeza do tempo. Deus sabe como sou sensível a esse tema, e em A ghost story temos a oportunidade de fazer uma belíssima viagem fabulesca através do tempo e do espaço.

O PROJETO FLÓRIDA vai partir seu coração


O complexo Walt Disney World está localizado na cidade de Lake Buena Vista, Flórida, Estados Unidos, próximo às cidades de Orlando e Kissimmee. Neste que é um destino desejado por gente do mundo inteiro, sob o slogan "onde os sonhos se tornam realidade", adultos e principalmente crianças podem aproveitar o melhor de sua infância.

No entanto, não muito longe de lá e à margem de qualquer possibilidade de uma vida abastada e mágica, existe um complexo de hotéis baratos onde moram Moonee (vivida pela SENSACIONAL Brooklynn Prince), uma menininha de seis anos, e sua jovem mãe solteira, Halley. Através de muita câmera de mão e uma pegada meio documental e intimista, você está prestes a embarcar no dia a dia das duas para viver seus dramas e momentos de total ternura.

Estava esperando escrever brevemente sobre esse filme no meu futuro post de apostas do Oscar 2018, mas, infeliz e injustamente, Projeto Flórida não deve concorrer a Melhor Filme. Mas, se eu o tivesse assistido ainda em 2017, com certeza estaria no TOP 3 do meu ano

Sean Baker, responsável pelo lindo Tangerina (todo filmado com celular), não só roteirizou e dirigiu Projeto Flórida, como também fez a montagem. Aqui, ele foi inteligente em apresentar a primeira meia hora do longa quase exclusivamente com cenas protagonizadas por Moonee e seus amiguinhos da vizinhança brincando nos arredores, destruindo coisas e falando muitos palavrões, numa conduta que estranharia qualquer pai e mãe que leva sua cria pra tomar banho de sol no calçadão do Leblon. A princípio, o espectador pode até se questionar aonde o filme está querendo nos levar. É aí que, à medida que ele avança e conhecemos mais a realidade em que estão inseridos, passamos a nos importar consideravelmente com suas vidas. Meu apreço por Projeto Flórida foi uma crescente assustadora.  

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Asas rosas de fada não me fazem, necessariamente, viver um conto de fadas
A humanização dos personagens aqui é uma coisa absurda. Halley, ainda que inconsequente e infantil, é uma mulher com pouco pra oferecer, mas inegavelmente ama a filha e tenta fazer o seu melhor para sobreviverem em meio a bicos e atitudes moralmente questionáveis. O administrador do local, Bobby, vivido por Willem Dafoe (que também  merece muito reconhecimento), é extremamente adorável: apesar de razoavelmente rígido com as regras que os hóspedes precisam cumprir, ele se esforça para que o convívio ser pacífico, agradável e possui uma relação de afeto especial com as crianças, agindo como uma espécie de tutor. O pouco que sabemos de seu passado vem de cenas curtas, mas tocantes, que funcionam para montar um background para o personagem. Apesar de estar em outra posição social, é um fodido como os outros.

Me comoveu como o pouco pode significar muito no contexto daquelas pessoas. Além do próprio nome do hotel - Magic Castle, uma alusão ao Magic Kingdom, que inclusive rendeu uma cena hilária no filme -, Bobby pinta o pequeno prédio de roxo numa representação da sua tentativa de trazer literalmente mais COR à vida presente ali; algo reforçado pelas casas coloridas e abandonadas que vemos nos cenários revolvidos pela trupe de crianças: ao mesmo tempo que remetem ao mundo mágico da Disney, afastam completamente uma realidade da outra. Um cupcake sob fogos de artifício vira o melhor aniversário possível. Um incêndio é sinônimo de entretenimento. Banho de chuva na rua vira diversão. Compras de bobagens em loja de R$ 1,99 são o maior acontecimento de um dia. Um café da manhã farto pode ser uma memória inesquecível (aliás, um dos momentos mais bonitos, fofos e tristes do filme). Projeto Flórida é um projeto de uma vida melhor que dificilmente sairá do papel.

Todo esse retrato social pesado é marcado pelos olhos da inocência, com a câmera frequentemente nos ombros, rosto ou na altura do olhar das crianças, que ora encaram cenas duríssimas de assistir, ora se concentram no que sabem fazer de melhor: brincar de bonecas e ver desenhos animados na TV, enquanto o som do que acontece ao fundo da cena é abafado. A sequência final, em que esperança e desesperança se chocam numa das passagens mais "destoantes" do longa - e, também por causa disso, fortíssima -, é de partir o coração. Mas outra coisa que criança sabe fazer bem é imaginar, e, portanto, pode criar o seu próprio final feliz.     

Não sei como Sean Baker conseguiu extrair aquela atuação da Brooklynn; se beslicou o braço dela, ameaçou jogar o cachorro de estimação na carrocinha ou contou uma história de horror, mas, de um jeito ou outro, os dois têm méritos o suficiente para merecerem mil prêmios.





O tecnológico e o primitivo em HORIZON ZERO DAWN


O primeiro game de mundo aberto a gente não esquece.

Quando coloquei o disco de Horizon Zero Dawn pra rodar pela primeira vez, era agosto de 2017. Desde então, portanto, até concluir a história, foram 6 meses jogando naquele meu ritmo maravilhoso de 3 horas a cada 3 semanas. Eu não esperava por essa; afinal, estava acostumada com jogos em que eu chegava ao fim com umas 10 ou 15 horas, com uma história fechadinha, e em Horizon me deparei com um novo estilo de game em que há uma narrativa principal a seguir, mas várias outras secundárias opcionais e inúmeros cenários pra explorar. 

Exceto por To the moon, que é um game bem simples e curtinho (e do qual falarei aqui em breve), eu fiquei presa à Horizon até terminá-lo – grande motivo que não me fez colocar RPG e mundo aberto na minha estante de favoritos. Apesar disso, quanto mais próxima eu estava do final, mais pena eu tinha de concluir a jornada da personagem. O jogo é um primor de tão bem feito.

Exclusivo para Playstation 4, desenvolvido pela holandesa Guerrilla Games, publicado pela Sony e ganhador de vários prêmios desde seu lançamento há um ano – incluindo "Melhor Jogo Original", atribuído pelo painel de juízes da Game Critics Awards –, Horizon Zero Dawn segue a trajetória de Aloy, uma arqueira ruiva de dreads maravilhosa que vive em um mundo pós-apocalíptico dominado por criaturas robóticas. Exilada de sua tribo junto do homem que a criou, o que mais deseja na vida é saber a sua origem e quem foi sua mãe, mas acaba descobrindo uma teia grandiosa de mistérios seculares.

O primitivo e o tecnológico convivem aqui de forma fascinante, como duas realidades em choque. A civilização como conhecemos não existe mais. O que temos são comunidades que louvam a deuses, dormem em cabanas, comem o que caçam, vestem peles e peças de aço precisam sobreviver em meio à hostilidade das máquinas, que habitam toda floresta e montanha. O que teria acontecido? Quem as construiu? Por que querem arrancar minha cabeça? O que foi que eu fiz? De onde vim? Qual braço da poltrona do cinema é o meu? Donald Trump é um reptiliano?


O visual é de cair o queixo (é provável que você queira gastar um tempo no modo fotografia do game). O detalhamento dos personagens, mesmo daqueles que aparecem por pouco tempo, impressiona: expressões faciais, aparência, vestes e as opções de armaduras pra Aloy usar ao longo do jogo. As vastas fauna e flora são riquíssimas em seu design. E as máquinas, claro, não ficam atrás: bati palmas pra originalidade na construção de suas estruturas, peculiaridades, funcionalidades e comportamentos. Coisas tão diferentes e que funcionam muito bem em conjunto, refletindo-se na própria maneira como controlamos Aloy.

Somos uma Aloy guerreira, mas que sabe muito bem usar um pequeno aparelho acoplado à sua orelha chamado Foco, que lhe dá informações sobre as máquinas, armas, recursos, pessoas, lugares, sinais, rastros e etc. além de funcionar como transmissor de mensagens Tipo um celular com um Google otimizado. Bem Black Mirror. O Foco nos auxilia a cumprir missões e a encontrar pistas para as revelações apresentadas durante o game, essenciais para dar impulso narrativo. Aloy invade máquinas antigas, encontra registros de áudio com testemunhos da civilização antiga, fragmentos de diários e objetos que seu povo nunca vira antes – peças de um quebra-cabeça que  montamos pouco a pouco.

É uma evolução incrível na nossa experiência enquanto jogador e no crescimento da Aloy, que foi uma personagem criada com muito esmero pela Guerrilla Games: ainda que badass, ela tem extrema empatia pelas pessoas que conhece, é doce, determinada, mas também cai em dilemas ha hora de tomar decisões importantes, contribuindo para a nossa identificação pessoal – a propósito, em vários momentos o jogo dá a opção para Aloy agir com a cabeça, com o coração ou com a raiva, moldando sua personalidade (mais para si do que para o jogo, pois, independente da resposta dela, não muda o desenrolar da narrativa). Sua figura multidimensional também é reforçada pelo belo trabalho de dublagem da Ashly Burch, de quem sou fã desde Life is Strange. A dublagem brasileira também não deixa nada a desejar; inclusive passei parte de Horizon jogando no idioma original e parte dublado, já que por várias vezes me perdia entre ler a legenda dos diálogos e agir (risos amarelos).

Falando em me perder, quando escrevi sobre The last of us, comentei que um dos grandes desafios do game pra mim foi precisar usar praticamente todos os botões do controle enquanto assoviava e chupava cana. Noob em neon continha escrito na minha testa. Em Horizon, é o mesma: no início, fiquei completamente embananada com tanta coisa pra administrar. É um negócio lindo de modeuso: a cada jogo eu aprendo mais e descubro que existem zilhões de coisas diferentes pra fazer. Além de interagir com vários outros seres humaninhos, existem as missões principais que são o fio condutor da história, as missões secundárias, o ganho de experiência que te permite ganhar mais força e habilidades, melhoria na montagem de armas, de trajes, poções e outros.

As batalhas são uma diversão à parte: apesar de envolver menos estratégia e mais munição, é sempre legal escolher uma moita pra se esconder e desmontar um robô na surdina, usar o Foco para detectar fraquezas e pontos fracos do seu corpo, montar armadilhas, saber usar as armas certas para determinado tipo de situação e de máquina e, claro, melhorar a mira (a minha é um terror).

Por fim, Horizon Zero Dawn é um combo maravilhoso que une jogabilidade bacana, ação, visual sensacional e uma história incrível. Sem dúvidas, daria um ótimo filme ou série.

Para quem concluí-lo, ainda há o DLC The Frozen Wilds, em que é possível interagir com máquinas e áreas inéditas, enfrentar novos perigos e descobrir outros segredos.




Apostas para o Oscar 2018


Senhoras e senhores, o Oscar já está batendo nas nossas portas: domingo, dia 04 de março, é dia de vigília no Twitter pra comentar os vestidos das celebridades e as justiças e injustiças da cerimônia.

E, como de praxe, eu por pouco não fui uma completa incompetente em assistir a pelo menos os filmes das categorias principais. Dessa vez, no entanto, não foi nenhuma negligência e falta de planejamento, mas falta de tempo mesmo. Mudanças significativas na minha vida, projetos novos, momento de organizar tudo, privação de sono, vontade de deixar tudo de lado por três dias e ficar jogando videogame etc.

Para este ano, estou positivamente surpresa! Entre os indicados a Melhor Filme, por exemplo, são vários filmes incríveis e que me pegaram de jeito (ui). As atuações estão soberbas, tanto femininas quanto masculinas. Ou seja, só motivos pra gente brindar com uma Cereser e fazer esse post gostosinho de apostas, que nada mais é do que uma desculpa pra falar de Oscar e filmes de novo, já que pra prever os ganhadores é só acompanhar o BAFTA, SAG Awards, DGA e afins, basicamente (taí a dica pra vocês fazerem seus bolões e ganharem as promoções de cinemas de onde cês moram).


MELHOR ATRIZ 


Concorrem:
Sally Hawkins - A Forma da Água
Frances McDormand - Três Anúncios Para Um Crime
Margot Robbie - Eu, Tonya
Saoirse Ronan - Lady Bird - A Hora de Voar
Meryl Streep - The Post - A Guerra Secreta

Para quem torço: Frances McDormand
Quem vai ganhar: Frances McDormand

Primeira vez concorrendo ao Oscar de Melhor Atriz, Sally Hawkins está ótima em A forma da água interpretando uma personagem muda e passando, só com o rosto e a linguagem corporal, a angústia, a insegurança, doçura e paixão de Elisa. Também estreando na categoria, Margot Robbie, essa pequena Barbie de Hollywood, ganhou destaque em O lobo de Wall Street por basicamente ser linda e em Eu, Tonya teve a chance de mostrar seu potencial artístico. Saoirse, em sua terceira indicação ao Oscar com apenas 23 anos, está deliciosamente engraçada, chata e fofa em Lady Bird, e isso é um elogio e tanto; afinal, graças a uma atuação que soube equilibrar todas as nuances por vezes divergentes de sua personagem adolescente, é que conseguimos ter empatia por ela. Meryl Streep dispensa apresentações; está bem, como sempre, e ouso dizer que é uma das únicas coisas realmente atraentes de The Post. Talvez Carey Mulligan, por Mudbound, ou Vicky Krieps, por Trama Fantasma, devessem ter concorrido também.

Mas Frances McDormand caga na cabeça de todo mundo. Na pele de Mildred em Três anúncios para um crime, ela é uma mulher amarga, endurecida pela morte da filha e, ao mesmo tempo, despedaçada por dentro. Ganhou o SAG, o Critic's Choice, o Globo de Ouro (que é igual a vários nadas na cadeia de importância das premiações, mas tá) e mais vários prêmios da temporada. Acho que não tem pra ninguém.


MELHOR ATOR

   
Concorrem:
Timotheé Chalamet - Me Chame Pelo Seu Nome
Daniel Day-Lewis - Trama Fantasma
Daniel Kaluuya - Corra!
Gary Oldman - O Destino de Uma Nação
Denzel Washington - Roman J. Israel, Esq. 

Para quem torço: Timotheé Chalamet
Quem vai ganhar: Gary Oldman

Se Daniel Day-Lewis ganhasse, eu também não ia reclamar nem um pouco. Daniel pode ganhar o Oscar de suggar daddy mais colosso. De sorriso mais charmoso. De melhor homão da pyrra a se aposentar em 2018. É, o Oscar pode até ter "mania" de premiar artistas por trabalhos anteriores (ainda mais nesse caso, quando é o último filme da carreira de alguém importante), mas, no caso desse cara, a indicação é merecida. Em Trama fantasma, ele mergulhou em um baita laboratório pra viver o perfeccionista e meticuloso estilista Reynolds Woodcok. Daniel Kaluuya está muito bem em Corra! (gosto dele desde aquele episódio de Black Mirror), assim como Denzel Washington em seu filme.

Minha torcida pra menino Timmyé por ele ter sido o principal motivo de eu ter gostado de Me chame pelo seu nome. O jeito como ele expressa sentimentos com o CORPO é fascinante. A cena final do personagem Elio encarando uma lareira por longos minutos me fez chorar tudo o que não chorei durante o longa. Entretanto, a estatueta deve ficar pro Gary Oldman - a Academia adora atores que se transformam para seus trabalhos, e em O destino de uma nação ele pode estar irreconhecível pra muita gente. Não só isso: o sujeito (que ganhou o SAG) vai muito além da surpresa de uma maquiagem muito bem feita e vive um Winston Churchill marcante.


MELHOR ATRIZ COADJUVANTE


Concorrem:
Mary J. Blige - Mudbound – Lágrimas Sobre o Mississipi
Allison Janney - Eu, Tonya
Laurie Metcalf - Lady Bird - A Hora de Voar
Octavia Spencer - A Forma da Água
Lesley Manville - Trama Fantasma

Para quem torço: Allison Janney
Quem vai ganhar: Allison Janney

Tirando Octavia Spencer, que, pelo segundo ano consecutivo, não sei o que está fazendo entre as indicadas da categoria (ela parece interpretar sempre a mesma personagem), todas as candidatas são merecedoras do prêmio. A atuação de Mary J. Blige é daquelas internalizadas, cheias de uma força que se mostra em momentos importantes. Laurie Metcalf faz a mãe de Lady Bird, que também gostei muuuito, principalmente porque consegui ver a mim mesma e à minha mãe nessas personagens do filme. Lesley Manville está maravilhosa como a irmã de Reynolds Woodcock, austera, autoconfiante e capaz de fazer você se urinar só com um olhar atravessado.

Embora Laurie tenha ganhado mais prêmios entre aqueles que concorria em relação ao número de Allison Janney,é esta quem deve ser a vencedora deste Oscar. Não somente pelos seus SAG e Critic's Choice, mas porque está diabolicamente mara como a mãe de Tonya Harding, também conhecida como a mãe que ninguém pediu a Deus. Mesmo baseada em uma pessoa real, duvidei que ela tivesse um coração de verdade batendo no peito.


MELHOR ATOR COADJUVANTE


Concorrem:
Willem Dafoe - Projeto Flórida
Woody Harrelson - Três Anúncios Para um Crime
Sam Rockwell - Três Anúncios Para um Crime
Richard Jenkins - A Forma da Água
Christopher Plummer - Todo o Dinheiro do Mundo

Para quem torço: Willem Dafoe
Quem vai ganhar: Sam Rockwell

Well, nessa categoria eu só morri verdadeiramente de amores pelo Willem Dafoe, que está incrível no espetacular fabuloso inesquecível maravilhoso


e sensacional Projeto Flórida. O personagem dele é VÍVIDO e eu queria ter ele por perto; um cara simples, administrador de um hotel-espelunca, mas muito atencioso com os hóspedes que mal tem onde caírem mortos. Richard Jenkins está bem em A forma da água, mas não me chamou a atenção, assim como Christopher Plummer. Que Deus me perdoe, adoro esse vovozinho, mas algo me diz que só foi indicado meixmo por causa da treta tretosa com o Kevin Spacey, que foi retirado do filme já na fase de pós-produção depois das acusações de assédio sexual e substituído pelo Plummer.

Me surpreendeu Woody Harrelson e Sam Rockwell indicados pelo mesmo longa, pois não é algo comum de acontecer; no entanto, não posso dizer que foi exagero: ambos estão excelentes em seus papéis. Minha torcida é do Dafoe porque o coração a gente obedece, mas ficarei muito satisfeita com a ganhadura do Rockwell, que interpreta um personagem babaquíssimo, porém cheio de camadas.


MELHOR DIRETOR


Concorrem:
Dunkirk - Christopher Nolan
Corra! - Jordan Peele
Lady Bird- A Hora de Voar - Greta Gerwig
Trama Fantasma - Paul Thomas Anderson
A Forma da Água - Guillermo del Toro

Para quem torço: Greta Gerwig
Quem vai ganhar: Guillermo del Toro

Sejamos diretos: caguei pra todo mundo aqui, é Greta na veia e o resto na cadeia.

A indicação dela como Melhor Diretora é histórica, já que, em todos esses anos de Oscar, é somente a quinta mulher a concorrer pela estatueta na categoria. Parabéns, Hollywood e Academia, por saírem aos poucos de suas cascas velhas e conservadoras. Mas a questão se resume a representatividade por aqui: Greta fez por merecer (aliás, faz há tempos, como roteirista e atriz), entregando um belo trabalho em Lady Bird e tendo seu talento finalmente reconhecido pelos grandões da indústria.

Guillermo del Toro, mais um mexicano que está entrando na lista de queridinhos da cerimônia (Iñarritú e Cuarón já se consagraram), vai levar a bola da vez com sua fábula fantasiosa lindinha. Ganhou o DGA e o Critic's Choice, pra mim não cheira e nem fede, mas em meu interior vou fingir que o prêmio é por sua obra-prima O labirinto do fauno.

Christopher Nolan, eu te amo, mas miga, Dunkirk nem deveria estar em nenhum lugar por aqui. 


MELHOR FILME


Concorrem:
Me Chame Pelo Seu Nome
O Destino de Uma Nação
Dunkirk
Corra!
Lady Bird - A Hora de Voar
Trama Fantasma
The Post - A Guerra Secreta
A Forma da Água
Três Anúncios Para um Crime

Para quem torço: Três Anúncios Para um Crime
Quem vai ganhar: Três Anúncios Para um Crime

Manos e manas, como eu disse lá em cima, são vários candidatos fortes.

Dos nove da categoria, apenas três considerei realmente méh: Dunkirk, The Post e O destino de uma nação. Lady Bird e Me chame pelo seu nome entraram na minha lista de Melhores filmes de 2017. Inicialmente, a passarinha era favoritíssima absoluta em meu lar, mas aí assisti a Três anúncios para um crime e a competição ficou acirrada. O drama com pinceladas de humor negro tem um roteiro, a meu ver, brilhante sobre a perpetuação do ódio e trabalha personagens falhos e multidimensionais por quem você fica genuinamente interessado, por mais escrotos que sejam (como o do Sam Rockwell e até mesmo o da Frances McDormand, dependendo do ponto de vista). Três anúncios venceu o Globo de Ouro como Melhor Filme, Melhor Atriz e Melhor Ator Coadjuvante; o SAG Awards de Melhor Elenco e o Critics Choice também nas categorias de atuação, além de ter sido muito bem avaliado nos festivais por onde passou, como Toronto e Veneza.

Em seguida, na minha ordem de preferência, vem o soberbo Trama Fantasma. Me chame pelo seu nome e A forma da água, igualmente lindos e que retratam uma história de amor "fora do convencional", brigam pelo lugar seguinte.

Mas, definitivamente, se Projeto Flórida tivesse MERECIDAMENTE concorrido a Melhor Filme, teria minha torcida integral com direito a apito, pompons coloridos e bandana na testa.


Outras categorias em que ainda posso palpitar:

Melhor Roteiro Original

Concorrem:
Doentes de Amor
Corra!
- Vai ganhar
Lady Bird - A Hora de Voar
A Forma da Água
Três Anúncios Para um Crime
- Torço

Melhor Roteiro Adaptado

Concorrem:
Artista do Desastre
Me Chame Pelo Seu Nome
- Torço e vai ganhar (ainda não terminei o livro, porém rs)
Logan
A Grande Jogada
Mudbound – Lágrimas sobre o Mississipi


Melhor Animação

Concorrem:
O Poderoso Chefinho
Viva - A Vida é uma Festa
- Torço e vai ganhar
O Touro Ferdinando
Com Amor, Van Gogh
The Breadwinner


(só vi dois dessa lista, mas Viva arregaça e já é sucessão)

Melhor Canção Original

Concorrem: 
"Remember Me" - Viva - A Vida é uma Festa 
"This is Me" - O Rei do Show
"Mighty River" - Mudbound – Lágrimas sobre o Mississipi
"Mystery of Love" - Me Chame Pelo Seu Nome- Torço e vai ganhar
"Stand Up for Something" - Marshall 

Ok, vamos lá: todas as músicas são boas, mas minhas favoritas disparadas são This is me e Mystery of love. Uma das duas vencendo, eu fico feliz. Remember meé lindinha, mas dentro do contexto do filme tem muito mais força; This is meé forte nos dois casos sendo a porta-voz dos oprimidos e Mystery of love tem uma melodia e letra belíssimas (amém, Sufjan Stevens).





Melhor Trilha Sonora Original

Concorrem: 
Dunkirk - Hans Zimmer
Trama Fantasma - Jonny Greenwood - Torço
A Forma da Água - Alexandre Desplat - Vai ganhar
Star Wars - Os Últimos Jedi - John Williams
Três Anúncios Para um Crime - Carter Burwell

Melhor Fotografia

Concorrem:
Blade Runner 2049 - Roger Deakins - Vai ganhar
O Destino de Uma Nação - Bruno Delbonnel
Mudbound – Lágrimas sobre o Mississipi - Rachel Morrison - Torço
Dunkirk - Hoyte van Hoytema
A Forma da Água - Dan Laustsen

Obs.: Rachel Morrison é a primeira mulher a ser indicada ao Oscar por Melhor Fotografia. Estou torcendo por isso mesmo, porque não assisti a Blade Runner 2049.

Melhor Figurino

Concorrem:
A Bela e a Fera
O Destino de Uma Nação
Trama Fantasma
- Torço e vai ganhar, o filme é sobre isso, porra
A Forma da Água
Victoria e Abdul - o Confidente da Rainha


Melhor Maquiagem e Cabelo

Concorrem: 
Extraordinário
Victoria e Abdul - o Confidente da Rainha

O Destino de Uma Nação - Vai ganhar, foda-se quem torce, bitches vocês já viram a maquiagem do Gary Oldman?

Lágrimas jorraram em FAREWELL, episódio bônus de LIFE IS STRANGE: BEFORE THE STORM


É pra glorificar de pé.

Depois de três (ou duas e meia) bolas foras, finalmente a Deck Nine mandou uma dentro. E ainda bem: porque estavam mexendo com as personagens mais queridas de Life is Strange; se o resultado final fosse um fiasco, o fandom ia reclamar mais que a Tulla Luana em dias de Colheita Feliz.

Não que Farewell (ou Despedida, no Brasil) esteja imune a críticas, mas, num modo geral, agradou bastante os fãs. O episódio bônus de Life is Strange: Before the Storm foi lançado globalmente no dia 5 de março nas plataformas PC, Xbox One e Playstation 4, depois de uma espera de mais de dois meses. Durando uma hora e meia, mais ou menos (quem gosta de explorar cada cantinho mínimo de cada espaço provavelmente vai gastar mais), ele se passa num período de algumas horas em um dia da infância/adolescência de Max e Chloe, quando ambas tinham 13 e 14 anos, respectivamente.

Com pouco mais de três minutos de jogo, meus olhos já estavam marejados. Não porque ele já começa apresentando uma cena dramática, mas a saudade das minhas personagens favoritas da franquia em momentos inéditos, a ansiedade acumulada e ouvir mais uma vez as suas vozes originais (lembremos que a dubladora da Chloe em Before the Storm foi outra) foram um combo-emoção. Aliás, posso começar os elogios ao episódio pela qualidade da dublagem: como sempre, Hannah Telle e Ashly Burch realizaram um trabalho incrível, mas Ashly em particular me impressionou pela forma como ela conseguiu transformar a voz tão querida e familiar da Chloe em um tom mais infantil e igualmente pertinente à personalidade dela na época. A qualidade dos gráficos, como já demonstrada nos episódios anteriores, enfatiza as expressões faciais. As sardinhas da Max estão mais aparentes (<3) e, os olhos, mais vivos e naturais.



Quem leu meus textos anteriores sobre o prelúdio sabe que tive problemas com Before the Storm pelo fanservice gritante e pelas inconsistências em relação à temporada original. Como dizem por aí: tinha "mais furos do que queijo suíço". E, por esses motivos, não consegui considerá-lo um jogo canônico.

Mas o fanservice de Farewell funciona não só pelo fator nostalgia, como para acrescentar e reforçar informações sobre as meninas anos antes dos acontecimentos de Life is Strange. Sem forçação de barra. E o melhor: sem inconsistências - pelo menos, todas que foram apresentadas até agora já caíram por terra. Parece até que a DONTNOD teve um dedinho nesse trabalho (ou que a Deck Nine aprendeu com os erros e as críticas) (ou que guardaram todo o esmero pra Farewell porque são pricefielders).

É lógico que eu queria um episódio mais longo e com puzzles mais elaborados? Sim, é. Meus pontos negativos se resumem a isso. Mas o que o estúdio entregou preenche a lacuna do meu coração e o aquece confortavelmente com os momentos mais ternos que Max e Chloe poderiam ter, dados os contextos. Aqui, estamos de volta na pele da fadinha linda rainha da terra encantada dos elfos Max Caulfield lidando com o dilema de contar "logo" ou não contar para Chloe que está indo morar em Seattle dentro de poucos dias. Enquanto isso, elas explodem barbies (HELLA YES), arrumam a bagunça do quarto e, ao encontrarem velharias cheias de significado pra amizade delas (redescobrimos que a Chloe é bastante sentimental quando se trata de ter que jogar fora algo que marcou suas histórias), decidem reviver as brincadeiras de piratas que faziam parte de seus dias quando mais novas.

Foi uma surpresa bem gostosa saber que elas se conhecem desde os cinco anos de idade (segundo a Deck Nine, rs) – o que é mostrado pra gente através da foto mais fofa EVER e quem não explodiu de amor já foi sugado pelos Dementadores há muito tempo:

Image may be NSFW.
Clik here to view.
Max and Chloe - Halloween 2001
Halloween 2001: fantasiadas de sanduíche de biscoito. Abraçadas porque eram o recheio. I CAN'T.
Antes do jogo lançar, Hannah disse em uma live que iríamos entender por que a ausência da Max impactaria tanto na vida da Chloe. Não que precisássemos assistir a algo pra realmente entender uma coisa dessa, mas ela tinha razão. É facilmente perceptível em Farewell o amor, cuidado e cumplicidade que uma tem pela outra desde sempre, e como a Chloe se sentia bem, completa e até mesmo corajosa ao lado dela – uma das passagens mais tocantes do episódio, que ajudou a tornar muito mais doloroso imaginar a fase que nossa amada punk passou quando ficou sem a melhor amiga e o pai.

Como em Before the Storm (ou como quase tudo em BTS deveria ter sido), as escolhas aqui são levam – e nem poderiam levar – a consequências impactantes, por motivos óbvios. No entanto, acho altamente recomendável jogar Farewell mais de uma vez para destravar diálogos e interações que parecem competir entre si no quesito NHOIMM MEU DEUS e/ou simplesmente apreciar um outro ângulo desta que é uma das relações mais apaixonantes de personagens com que já me envolvi (seja de game ou de qualquer outra plataforma) nessa vida. O jogo também traça vários paralelos com a história e desenvolvimento das duas na primeira temporada, então é bem interessante se manter atento e captá-los.

A única coisa ruim de repetir Farewell algumas vezes é ter que encarar o seu final– uma cena quase tão difícil de reassistir quanto o final Sacrifice Bae, na minha opinião. Estou, inclusive, evitando ouvir Black Flies, do Ben Howard, para não despertar os feels e relembrar não só a Chloe agarrada ao seu gravador, mas o verdadeiro significado do título Despedida desse episódio: o nosso último adeus à Max e Chloe em uma última oportunidade de jogar com elas.

Ainda não sei se a ficha caiu. Mas, quando cair, vai ser de uma altura bem considerável.





O amor que transcende espaço e tempo em PACIÊNCIA


Não sou das maiores leitoras de quadrinhos (infelizmente, e por enquanto), mas topei com a existência de Paciência naquela considerada a melhor rede social da world wide web: o Twitter. Na ocasião, alguém retuitou um desconhecido elogiando a obra e usando as palavras mágicas que deixaram minhas anteninhas ligadas: "viagem no tempo". Não precisei nem de dez minutos pra comprar um presente pra mim mesma.

Quando abri o pacote de papelão dos Correios, pouco tempo depois (ou seja, um milagre), me deparei com um trem tão lindo que deu vontade de folhear com luvas, pra não correr o risco de estragar. Capa cartonada, um acabamento gráfico sensa, hot stamping no título e muitas cores. Joguei o pacote no lixo do quarto e já fui deitando na cama; um par de horas depois e eu havia concluído a leitura.

Paciência levou cinco anos para ser produzida por um dos principais nomes dos quadrinhos indie norte-americanos – Daniel Clowes. O sujeito, pelo que andei fuçando, tem muitos fãs, outros títulos premiados, adaptação pro cinema, e esse seu trabalho mais recente já ganhou espaço em listas de melhores quadrinhos de 2017. O segredo para tanto sucesso talvez tenha parte na estratégia de Clowes em não deixar uma sinopse na contracapa, apenas uma frase misteriosa: "Uma viagem cósmica através do espaço-tempo rumo ao infinito primordial do amor eterno". E, se posso começar falando alguma coisa sobre potencializar sua experiência com essa HQ, é justamente "quanto menos você souber a história, melhor".

(Olha, mesmo eu comprando Paciência sabendo o mínimo possível, eu não queria contar esse mínimo possível aqui. Se bem que, agora, o mínimo do mínimo você já sabe, que é viagem no tempo. Então, acho que isso já é o suficiente. E que Paciência é o nome da amada do cara que nos guia pela história, chamado Jack Barlow.)

A HQ nos apresenta uma pegada desse viés de ficção científica que quebra expectativas, mas de forma perfeitamente acessível. Entre as reviravoltas que acontecem para nos tirar do lugar (mesmo no meu caso, perfeitamente confortável sobre almofadas), a trama bem costurada trata de obsessão, amor, de como pequenas coisas podem virar nossa vida de cabeça para baixo e das consequentes dificuldades de superar o passado. E, em meio a isso tudo, encaramos uma evolução orgânica de um personagem que inicialmente se mostrava um banana e termina como outra pessoa, provocando reflexões sobre questões morais e o que acharíamos delas se ficássemos face a face com a situações que Jack enfrentou, ajudando-nos a compreender suas motivações. No fim das contas, Jack não tinha Paciência nenhuma – nos sentidos que você quiser imaginar: uma conclusão meio tosca da minha parte, mas que quem leu provavelmente deve concordar.


Paciência nos conduz por páginas recheadas de suspense, sarcasmo, acidez, pessimismo, loucura, até críticas e uma participação pequenina de Luan Santana (é verdade!) (taí uma coisa desnecessária, era só traduzir a música do inglês). O balanço entre narrativa textual e visual, pra mim, é bem equilibrado. O traço não chega a ser realiiiista (na real, em vários quadros é meio mal-acabado), mas achei bacana como as cores vibrantes ora fazem um contraponto ao pessimismo mencionado, ora reforçam a loucura dos pensamentos de Jack, numa linha um tanto psicodélica. Aliás, em vários momentos os balões de fala de outros personagens são cortados pelo espaço do próprio quadro, em uma solução criativa para mostrar para o leitor como o Jack estava absorto por outras distrações, ações ou pensamentos (geralmente ligados a uma certa obsessão), não prestando atenção no que está sendo dito.

O final de Paciência pode requerer alguma interpretação ou reflexão maior sobre o que de fato aconteceu, mas, pela minha experiência, mais valeu a jornada de leitura até ali do que o fim em si. De qualquer forma, é uma HQ que merece ser apreciada pelo menos duas vezes. De preferência, antes de o filme baseado na obra estrear em algum ano desses – os direitos foram comprados pela Focus Feature e, segundo as boas línguas, o roteiro será do próprio Daniel Clowes.


UM LUGAR SILENCIOSO não me deixou em paz


Um lugar silenciosoé o mais novo filme da princesa Emily Blunt, dirigido pelo seu marido John Krasinski (o Jim de The Office), enquadrado nessa nova e maravilhosa onda dos filmes de horror, para o qual eu não estava dando nada mesmo depois dos trailers, até as pessoas começarem a falar bem, porque eu sou Maria-vai-com-as-outras, e é isto.

A sinopse, sobre uma família que vive numa casa de campo em absoluto silêncio, se comunicando através de sinais, na tentativa de sobreviver à uma ameaça desconhecida atraída por sons, me lembrou a trama de Caixa de pássaros. Só que, no caso dela, a ameaça é algo que a pessoa VÊ e a mata em seguida. O livro é uma merda, o filme será lançado num futuro próximo na Netflix com a Sandra Bullock protagonizando, mas, se a produção conseguir fazer com que a adaptação seja ótima como é Um lugar silencioso, eu serei obrigada a gongar Caixa de pássaros só pela metade.

Um lugar silenciosoé mais uma prova de que eu não sobreviveria muito tempo em ambientes pós-apocalípticos (no caso, eu morreria antes de ser pós). Para garantir o oxigênio de cada dia, é preciso andar nas pontas dos pés, em areias macias, ter movimentos delicados e vagarosos, sussurrar e, de preferência, se comunicar por sinais. Não pode cantar ópera, não pode assoviar, não pode peidar alto. Do contrário, criaturas extremamente nojentas numa versão upgrade do Demogorgon vêm rapidinho arrancar seus membros numa patada. Aliás, o visual delas é bem perturbador, principalmente quando mostram a cavidade auricular responsável pela sua audição superpotente. Denotam toda a aura de perigo e morte que a produção, provavelmente, ansiava.


Apesar de o filme revelar seus "monstrinhos", indo contra aquele terror psicológico sobre aquilo que não vimos/aquilo que não sabemos (como o ótimo Ao cair da noite), ele trabalha muitíssimo bem a questão do silêncio e do barulho para provocar uma atmosfera de tensão constantemente incômoda. Um lugar silencioso não me deixou em paz. Fazia tempo que eu não precisava cobrir os olhos ou os desviar da tela por antecipar algo assustador. Se você tiver a sorte de assistir em uma sala de cinema livre de neandertais, vai experimentar uma imersão, eu diria, necessária. Principalmente no início da projeção, quando nos é apresentado o cenário daquele futuro (2020, pra ser mais exata) devastado e a importância do silêncio quase absoluto, os coleguinhas de sessão não deram um pio sequer. Eu cheguei a parar de mastigar um pouco a pipoca e prender a respiração. Não passava uma agulha no de ninguém. Eventuais sons que vinham de fora da telona me sobressaltavam. O filme tem alguns jumpscares, sim, mas que em nenhum momento soaram gratuitos e, por isso mesmo, funcionaram.

O elenco inteiro está muito bem. Raramente falando uns com os outros, os personagens - como já dito - se comunicam por sinais, pela expressão facial e pelos olhos. O medo estampado no rosto, a tristeza, a angústia e o amor são pungentes (inclusive, numa cena perto do final e que tem tudo a ver com isso, foi quando estive prestes a chorar). Emily Blunt brilha! Não vou ficar cheia de dedos pra contar porque isso está no trailer, mas (caso não tenha visto e nem queira ver o trailer, passa para o próximo parágrafo!) a sua personagem está grávida e imagino que os outros que assistiram comigo também ficaram sofrendo por antecipação sobre como criariam um bebê que chora e grita durante uns bons anos da vida. A preocupação e desespero que Blunt passa somente com linguagem corporal, antes e depois do parto, impressionaram.


Krasinski tem toda a minha empatia pelo marido e pai protetor e humano, que quer manter a família longe de ameaças até onde não estiver ao seu alcance. Noah Jupe (o BFF do menino Auggie, em Extraordinário) convence como o filho amedrontado pela nova realidade, que precisa encontrar coragem interior, mas quem rouba as cenas no elenco infantil é Millicent Simmonds. A atriz, deficiente auditiva na vida real e também como a personagem primogênita do casal (condição responsável por uma sacada bem legal no filme), é extremamente carismática e fez um belo trabalho. Agora, estou curiosa para vê-la em Sem fôlego, longa recente do amado Todd Haynes (diretor de Carol), ao lado de Julianne Moore. 

Um lugar silencioso pode até ter uns probleminhas de roteiro, mas que não tiram seu brilho. O aspecto do horror, harmoniosamente mesclado com o drama, resulta em uma obra que dá uma nova lufada fresca ao gênero, emocionando pelo contexto dos fortes laços familiares em relação à solidão, esperança e ao futuro. 




Um suspiro a cada página de ME CHAME PELO SEU NOME


É com o coração em frangalhos, semirecuperada de três metros de ranho escorrendo pelo nariz, que venho falar de Me chame pelo seu nome – o livro que está marcando minha volta definitiva à leitura, parcialmente abandonada de um ano pra cá.

ABAIXA QUE É TIRO

Escrita pelo ítalo-americano-egípcio (eita!) André Aciman, a trama é narrada pelo protagonista Elio, um adolescente de dezessete anos que está passando as férias na casa da família, em um paraíso da costa italiana (chamada apenas de "B."), parada certa de amigos, vizinhos, artistas e intelectuais de todos os lugares. Filho de um importante professor universitário, o jovem está bastante acostumado à rotina de, a cada verão, hospedar por seis semanas na villa da família um novo escritor que, em troca da boa acolhida, ajuda seu pai com correspondências e papeladas. Uma cobiçada residência literária que já atraiu muitos nomes, mas nenhum deles como Oliver.

Elio imediatamente, e sem perceber, se encanta pelo americano de vinte e quatro anos, espontâneo e atraente, que aproveita a temporada para trabalhar em seu manuscrito sobre Heráclito e, sobretudo, desfrutar do verão mediterrâneo. Da antipatia impaciente que parece atravessar o convívio inicial dos dois surge uma paixão que só aumenta à medida que o instável e desconhecido terreno que os separa vai sendo vencido.


O livro foi lançado em 2007, mas demorou isso tudo pra chegar ao Brasil porque só agora foi de interesse dos filhos da puta dos marketeiros, aproveitando o sucesso da adaptação cinematográfica que foi uma das candidatas ao Oscar 2018 e um dos melhores filmes que assisti no ano passado. Bom, a justiça tarda, mas não falha. A divina, no caso. Acho. Porque o que importa é que, mesmo já tendo assistido ao filme, a leitura de Me chame pelo seu nome foi uma das mais prazerosas e marcantes dos últimos tempos.

Eu diria que, desde as primeiras páginas, minha vontade era de largar tudo, antecipar minha cidadania italiana e viajar pra Europa a fim de fazer jus ao tamanho do meu nariz junto aos meus semelhantes. Não sei exatamente qual foi a mágica de Aciman (inclusive, estou estudando isso), mas ele transformou uma história repleta de dias de marasmo em uma linda confissão de desejo e um turbilhão de sentimentos conflitantes que determinaram o ritual de passagem de Elio. Aciman demonstra ser um profundo conhecedor das ações e reações humanas, do que idealizamos, experimentamos e sofremos com o primeiro amor. Me chame pelo seu nomeé pura poesia que me deixou absolutamente fascinada e envolvida. É literatura de alta qualidade, amarrada com parágrafos de palavras escolhidas a dedo. Nada sobra, nada falta: tudo feito na medida para arrancar suspiros frequentes.

Em passagens fluidas, Elio nos conta suas lembranças daquele verão dos anos 1980 que o marcaria para sempre em uma linguagem coerente com o perfil de um adolescente acima da média, que lê filosofia e estuda música erudita, mas cheias de visceralidade, delicadeza e erotismo. Me chame pelo seu nomeé sobre Elio; sobre autodescobertas, tanto sexuais quanto de identidade no mundo. É impressionante como me peguei ansiosa, como o personagem, para descobrir se o que ele tanto queria iria se concretizar, ao mesmo tempo em que o medo era óbvio e angustiante. "É melhor morrer ou falar?" E o Elio queria, e que se reflete totalmente no título da obra, era mais do que observar e amar cada pedacinho de Oliver: era ser o Oliver, estar nele, sob suas roupas, em sua pele, e que Oliver também experimentasse o mesmo. Intenso, como geralmente é esse momento da vida.

O filme é muito fiel ao livro, salvo pequeninas mudanças, inclusive no final. A cena do pêssego está presente, e longe de ser escandalosa. Como no filme só podemos interpretar a linguagem corporal de menino Timothée Chalamet e, no livro, o que ele sente é bastante destrinchado, talvez neste fiquem mais "compreensíveis" suas intenções. E para a Galera Chata do Caralho™ de plantão, Me chame pelo seu nome não bate na tecla da homofobia, do ser gay ou não ser, ou da aceitação. Não que a obra original precise confirmar a ausência dessas questões no filme, porque eu sou da opinião de que filme não é obrigado a abordar tema nenhum (como esses, por exemplo, do universo LGBT). E, sinceramente, nem é preciso que o livro diga com todas as palavras; só o fato de Elio e Oliver demorarem tanto para enfim colocarem as cartas na mesa já implica nesse contexto.

Inclusive, pincelando isso com chave de ouro, aquele monólogo MARAVILHOSO do pai do Elio que há no filme está aqui, quase integralmente idêntico. Não vou transcrever porque seria spoiler, mas é algo sobre não evitar sentir dor, porque evitar o que quer que seja é um desperdício. O tipo de trecho de um livro que você tem vontade de grifar, recortar, colar na parede, criar gif e enviar para todos os contatos do Whatsapp, depois de um abraço.

Terminei Meu chame pelo seu nome da melhor maneira possível: com a voz de Sufjan Stevens entoando Mystery of love na minha cabeça. Sem fôlego. Certa de que precisaria recomendá-lo ao maior número de pessoas imaginável.


"Encontramos as estrelas, você e eu. E isso só acontece uma vez na vida"



O HOMEM DE GIZ bebeu da fonte de King, mas não matou minha sede


(Enquanto pensava se o título desse post era barango ou não, apertei o botão de publicar.)

Aviso: este texto contém spoilers.

Venderam O homem de giz pra mim como um livro escrito por uma grande fã de Stephen King, com várias referências a obras do muso. No próprio Skoob, a frase "Assassinato e sinais misteriosos em uma trama para fãs de Stranger Things e Stephen King" engorda a campanha de marketing. Opa, rapaz, é assim que se joga uma isca pra mim. Agarrei direitinho e me dirigi ao setor de compras da livraria online mais próxima e, na noite do mesmo dia, dei início à leitura.

"Em 1986, Eddie e os amigos passam a maior parte dos dias andando de bicicleta pela pacata vizinhança em busca de aventuras. Os desenhos a giz são seu código secreto: homenzinhos rabiscados no asfalto; mensagens que só eles entendem. Mas um desenho misterioso leva o grupo de crianças até um corpo desmembrado e espalhado em um bosque. Depois disso, nada mais é como antes.

Em 2016, Eddie se esforça para superar o passado, até que um dia ele e os amigos de infância recebem um mesmo aviso: o desenho de um homem de giz enforcado. Quando um dos amigos aparece morto, Eddie tem certeza de que precisa descobrir o que de fato aconteceu trinta anos atrás.
Alternando habilidosamente entre presente e passado, O Homem de Giz traz o melhor do suspense: personagens maravilhosamente construídos, mistérios de prender o fôlego e reviravoltas que vão impressionar até os leitores mais escaldados."

"Personagens maravilhosamente construídos, mistérios de prender o fôlego e reviravoltas que vão impressionar até os leitores mais escaldados."


O começo parecia promissor, mesmo com muitas similaridades que já haviam atropelado a intenção de causar apenas nostalgia ou funcionar como uma espécie de easter egg de A Coisa. Eu cheguei a anotar (opa, agora são spoilers desse livro também!):

✓ Grupo de amigos que viveu décadas atrás e suas bicicletas
✓ Apelidos que eram pra ser marcantes, mas soaram esquisitos
✓ Guerra de pedras
✓ Abrigo construído pelas crianças
✓ Bosque x Barrens
✓ História contada em duas partes: na infância e na vida adulta
✓ Gangue inimiga com três garotos mais velhos
✓ Personagem chamado mr. Halloran (no caso, de O iluminado)
✓ A única menina do grupo é ruiva, moleca, não tem um bom relacionamento com o pai e é a paixonite do protagonista

QUÉDIZÊ. Pois é.
Esses pontos nem me incomodariam tanto (até porque uma homenagem ao meu livro favorito é uma ideia que me agrada), se a narrativa não fosse tão pobre e, os personagens, ao contrário do que grifei da sinopse oficial, rasos demais. O ponto positivo do livro é que ele é fácil de ler, rápido e prende a atenção a ponto de você querer chegar ao final o mais rápido possível a fim de unicamente descobrir qual é o mistério. No entanto, como eu já disse aqui outras vezes, isso tudo não é necessariamente sinônimo de uma história bem construída (que o diga o já malhado por mim Caixa de pássaros).

A relação com King ficou só nos tópicos citados mesmo, porque a autora de O homem de giz, C. J. Tudor, passou longe do talento do cara de criar uma narrativa envolvente e personagens sólidos, carismáticos. Se caísse uma bomba na cabeça de qualquer um ali, até do protagonista, eu ia cagar e andar. E odeio quando isso acontece. Cês acham que gosto de gongar livro aqui? Primeiro, que gastei dinheiro com uma história que me causou indiferença ao final; segundo que, né, qual leitor quer terminar a última página de alguma coisa insatisfeito?

Faltou Tudor evocar uma atmosfera sombria de qualidade. Faltou criar argumentos que fortalecessem os laços daquele grupo de crianças, como acontece eficientemente na obra que supostamente a inspirou; a menos, claro, que o objetivo tenha sido apenas desenvolver a dinâmica sem graça de crianças que brincam, zoam umas às outras e desenham bonecos de giz completamente desinteressantes. Sério, acho que num total de 0 momentos eles me deixaram intrigada. Faltou, também, mais tensão (não serei injusta dizendo que não fiquei NADA apreensiva em outras cenas).  Talvez a culpa esteja na forma como a história foi costurada. No prólogo, por exemplo, a autora já adianta que em algum momento uma criança irá guardar numa mochila a cabeça da vítima do tal assassinato da sinopse. Essa cena, do encontro com o corpo, só acontece sei lá, aos SETENTA POR CENTO do livro, pra se ter uma ideia. Todos os outros acontecimentos misteriosos que parecem surgir, a princípio, aleatoriamente, são amarrados com uma corda bem porca e frouxa - se é que posso dizer amarrados. A revelação do verdadeiro culpado, razoavelmente previsível, foi ofuscada, na minha experiência, pela justificativa do crime e como a morte ocorre, me soando pouco crível. Na moral, confundiu a própria filha com uma qualquer pelo CABELO? E ainda assim esquarteja a coitada? E aquela ligação sem lógica com o cabelo recém-pintado da Chloe? Sem contar furos, coincidências convenientes e personagens descartados.

É isto.

Se você não gostou tanto também, gonga junto comigo aí nos comentários. Se gostou, joga os motivos aí na mesa. Se não leu ainda e mesmo assim veio caçar texto com spoiler, espera que daqui a pouco aparece uma adaptação cinematográfica porcaria da Netflix.



Sobre WHAT REMAINS OF EDITH FINCH, vencedor do "Oscar dos videogames"


Há um ano era distribuído pela Annapurna Interactive o game de suspense e aventura da Giant Sparrow que, em 2018, ganharia o BAFTA Games Awards de "Melhor jogo" – contrariando as apostas em Horizon Zero Dawn, sobre o qual já falei aqui. Disponível para PC, PS4 e Xbox One, What remains of Edith Finch conta a triste história das gerações da família Finch, que acreditava estar sob alguma maldição, já que os seus membros costumam morrer de forma trágica e repentina.

No jogo, estamos na pele de Edith, última da linhagem dos Finch, que retorna à antiga casa de seus antepassados anos depois de uma tragédia. Finalmente livre para explorar o lugar, ela tem a oportunidade de conhecer todos os cantos por onde viveram, já que praticamente cada cômodo da casa pertenceu a um Finch e sobreviveu até o momento como um grande memorial e um ode às suas (muitas vezes curtas) existências. Com um caderninho em mãos, nós, como Edith, passamos a reconstruir a árvore genealógica da família ao descobrirmos passagens secretas e quartos escondidos à medida que somos convidados a experimentar o último dia de vida de cada pessoa


A experiência com o jogo é fascinante. Com visão em primeira pessoa, desde o início somos absorvidos pelo ambiente misterioso que começa no bosque que circunda a casa desengonçada e meio assustadora, cujas legendas da narração da nossa guia Edith surgem na tela como os textos de um livro de contos de fadas. A construção dos inúmeros cenários internos merece mil elogios; meio claustrofóbicos, causam angústia e ternura ao mesmo tempo, uma vez que sabemos que os objetos abandonados fizeram parte dos sonhos e dores de cada Finch, gente como a gente, personagens com os quais o jogador cria afeição rápido, mesmo sabendo que eles não estão mais ali. Pra otimizar a imersão, é fundamental evitar perder detalhes espalhados pelos cantos que ajudam a montar toda a trama.   

Num geral, a jogabilidade de What remains of Edith Finché bastante simples, como num game point and click. Aqui, é preciso apenas andar, usar o zoom para olhar coisas de perto e interagir com objetos e executar outras ações com R2 (no meu caso, no PS4). No entanto, o jogo mostra todo o seu brilho nos momentos em que calçamos os sapatos dos membros da família em seus últimos suspiros, quando a dinâmica é adaptada para cada universo particular para contar, muitas vezes de forma lúdica, o que aconteceu com cada um. Em um momento, controlamos brinquedos numa banheira; em outro, somos um gato ou uma cobra; em mais outro, montamos o quebra-cabeças de um acontecimento exclusivamente por trás das lentes de uma câmera. Manos, o bagulho é daora mesmo. E funciona tão bem que até hoje, enquanto como meu cereal matinal, me pego encantada com a história de um Finch específico, em que vivenciamos os devaneios de um sujeito que passa seus dias fatiando peixes enquanto sonha com mundos fictícios para escapar de sua própria realidade. A maneira com que manipulamos a manete e temos que prestar atenção em determinada parte da tela é perfeitamente compatível com o que o personagem estava sentindo.

Trecho do meu jogo

A cerejinha no bolo fica por conta da trilha sonora COISA MARLINDA de Deus. Um dia aí, incrusivs, precisei pausar o game por um tempo e deixei de bom grado o menu em stand by com a música-tema tocando repetidamente. O desfecho sobre o destino de Edith, como uma "Finch amaldiçoada", pode até ser um pouco previsível para alguns, mas foi feito de forma tão bonita que fecha o jogo satisfatoriamente, deixando margem pra interpretações sobre a fugacidade da vida, a importância da família no nosso desenvolvimento, a força dos laços e sobre seguir o coração.

Posso ter preferido que Horizon Zero Dawn ganhasse o prêmio no lugar dele, mas fiquei um bom tempo, após concluir What remains of Edith Finch, pensando em seus personagens e trajetórias como pessoas que conheci de verdade. E isso me marca mais do que jogos com mecânicas extremamente elaboradas.




2 séries policiais bacanudas da Netflix pra conhecer


Eu amo, amo a temática policial e, depois de já ter recomendado três séries do tipo aqui, hoje vou dar a dica de duas séries que estão na Netflix. E já vou avisando: não são a piiiiiica das galáxias não, mas entretêm bem e me fizeram maratonar em dois dias.

A primeira delas na verdade é uma minissérie e se chama La mante, do original em francês, ou, aqui, A Louva-a-Deus. Em apenas 6 episódios, a história se passa décadas após a captura de uma serial killer conhecida como A louva-a-Deus, que oferece ajuda para solucionar uma sequência de assassinatos inspirados em seu modus operandi. Porém, com uma condição: trabalhar junto do filho policial responsável pelo caso, que ela "abandonou" quando foi presa.

Tirando o fato de que 90% do elenco é desprovido de carisma, principalmente o filho da senhora trevosa, a minissérie costura bem as pistas– muitas delas, falsas – em direção ao imitador dos crimes, de modo a sempre ter bons ganchos que levam o espectador a nunca querer fazer uma pausa entre os episódios. De acordo com Serial killer - Louco ou Cruel?, livro da Ilana Casoy que estou lendo no momento junto de um romance policial, assassinas em série são bem mais incomuns do que assassinos, além de terem motivações diferentes para matar, e por isso achei interessante a abordagem de uma criminosa do tipo nesta história. Ao longo da trama, descobrimos as razões que fizeram a Louva-a-Deus ser quem é, extremamente ligadas à misoginia; o impacto disso no filho e em como ele precisa lidar com isso ao ver-se obrigado a conviver com alguém que despreza; e como a questão da maternidade segue a narrativa da minissérie, culminando num desfecho que, pra mim, foi bem satisfatório e não requer nenhuma possível continuação.

Aliás, se eu tiver que destacar uma atuação nesse samba, seria a da Carole Bouquet, a "la mante". Elegantérrima. Olhar de Medusa. Jamais gostaria de encontrá-la na minha cozinha quando eu fosse beber água à noite.

Apesar de eu ter descoberto sozinha quem é o imitador, tirando um pouco o impacto da revelação, o ritmo é deliciosamente acelerado e algumas reviravoltas surpreendem, mas o melhor de tudo é poder ouvir gente falando em francês por aproximadamente seis horas.




A outra indicação, série de 10 episódios original da TNT que estreou recentemente na Netflix, se chama The alienist e se passa na Nova York do final do século XIX. Trazendo rostinhos conhecidos, como Luke Evans, Dakota Fanning e o fofinho Daniel Brühl, a história baseada na obra homônima de Caleb Carr segue o dr. Kreizler, um reconhecido alienista – termo usado para psiquiatra até então –, que passa a investigar paralelamente à polícia um caso bizarro de assassinatos em série de garotos. Com a ajuda do ilustrador John Moore e da datilógrafa Sara Howard, ele inicia o que parecia ser, na época, os primeiros passos da construção de um perfil mental de um assassino, me lembrando muito o tema central da maravilhosa Mindhunter.

Confesso que comecei a série um pouco relutante (estou começando a escrever um romance policial e qualquer referência é válida neste início de jornada), no primeiro episódio estava achando o ar um pouco novelesco (oi, La casa de papel), mas fui surpreendida aos poucos. Ao contrário de A Louva-a-Deus, The alienist me fisgou mais pelos personagens, que são bastante cativantes – mesmo o fechadão dr. Kreizler e aqueles que aparecem por pouco tempo. Torci e sofri junto com eles. A personagem da Dakota, em especial, me causou maior apreciação por estar numa posição ao mesmo tempo privilegiada e ameaçada; como primeira funcionária mulher da polícia da cidade, ela precisa conviver diariamente com os olhares masculinos que não preciso nem explicar no que implicam, numa tentativa constante de provar seu valor como profissional e ser humano. Sara Howard é, como dizem, "à frente de seu tempo" e isso se reflete em quase todos os seus comportamentos, mesmo fora da delegacia, impactando na dinâmica com o personagem de Luke Evans e ajudando a apresentar a personalidade deste. /shipei porém não

Na minha visão, alguns pontos do roteiro de The alienist não são sólidos e, como acontece em A Louva-a-Deus, pistas falsas para confundir o público e mantê-lo vidrado acontecem. *suspiro* Bom, foda-se né, mores, funcionou e terminei a série em menos de 24h. Tirando um CGI meio porco, a reconstrução da época é muito bem feita e os figurinos são de impressionar. Inclusive fiz um registro mental de todos os modelitos que Dakota usou em cena e quero todos, mesmo em 2018. A conclusão da história é bonita, dentro de seu contexto, apesar de uns clichês que não me incomodaram tanto. Espero também que não tenha uma segunda temporada, porque, pra mim, formou balada e não se mexe em time que tá ganhando. Das ambições da TNT eu não sei, mas a Netflix precisa segurar esse rabo, porque exemplo de temporadas novas pra séries que já tinham um final não faltam.

BONECO DE NEVE, de Jo Nesbø: livro + filme

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Sim, eu mesma fiz essa belíssima montagem, obrigada
Pelo que andei lendo, Boneco de Neve é um dos vários livros do norueguês Jo Nesbø cujo protagonista é Harry Hole, um investigador policial fodão, porém fodido no amor, no tato social e na sobriedade. Considerado pelo The Guardian seu livro mais ambicioso, Boneco de Neve também é conhecido como a obra mais arrepiante do escritor por outros veículos e leitores. Na história, Harry vira o cabeça de uma investigação que está atrás de um serial killer denominado Boneco de Neve, que mata mulheres quando cai a primeira neve em Oslo, deixando um presentinho montado no local do crime, que é isso mesmo que você está pensando.

A Noruega é um dos melhores países para se viver. Tem o melhor Índice de Desenvolvimento Humano do mundo e pessoas ajudam vovozinhas a atravessarem a rua. Não sei se é como na Islândia, onde a polícia provavelmente passa os dias jogando paciência enquanto algum crime acontece a cada 20 anos, mas ter um assassino em série à solta certamente não foi nada comum pra Harry e a polícia da capital. Considerado o mais capacitado para o caso, com curso no FBI e único profissional norueguês com captura de um criminoso do tipo no currículo, ele parte para uma investigação que envolverá vários personagens, inclusive alguns que possuem correlação, confirmando a teoria de um dos sujeitos do livro: “A Noruega é um país tão pequeno, que todos estão no máximo a duas pessoas de se conhecerem.”

Boneco de neve começa muito bem e sabe sustentar seu clima denso de suspense. Pelo menos comigo, foi até curiosa a forma como eu fui fisgada pelo clima; quase dava pra sentir o frio e a aura pesada e cinza da história. Reforçou minha ânsia em abrir o livro dentro do ônibus, mesmo em pé e carregando uma mochila de cinco quilos. No emaranhado de mistérios e coincidências, Nesbø amarra seus capítulos com pistas plantadas desde o início, nunca soando como encheção de linguiça, por mais que eu tenha visto alguns leitores reclamando disso. Algo que acontece no final da trama ou que Harry faz uma associação sempre tem a ver com algo já mostrado bem antes, então prestar atenção em cada detalhe é bão. Os diálogos são bem construídos, deixando o livro ainda mais fluido, quase como se a gente estivesse assistindo a um filme. Outra coisa que enriqueceu a história e o BG dos personagens foi o uso de POV com vários deles, mesmo em terceira pessoa - coisa que, inclusive, gosto mais do que quando aplicado em primeira pessoa. Já quanto ao carisma... bom, Harry Hole não é a pessoa mais carismática do universo, mas é o protagonista, então somos obrigados a engoli-lo. Quem mais ganhou minha afeição foi Katrine Bratt, a parceira dele no caso, que a propósito tem uma participação bem mais interessante do que parece (na falta de palavra melhor pra evitar spoilers).

O que pode ser chato pra alguns é a grande quantidade de personagens, mesmo com esse BG que não os deixa simplesmente balançarem soltos nas páginas, e os nomes. Norueguês não é um idioma familiar, e eu confesso que me confundi várias vezes com quem é quem. Outra coisa: a última parte do livro começou a dar uma caída, e a sensação foi de que o autor perdeu um pouco do esmero que teve pra amarrar a narrativa como ela estava rolando até então. Sem contar alguns clichês de romance policial que não chegam a cortar o clima, mas deram aquele gostinho ruim de "eu já li isso antes". De qualquer forma, quando fecho a capa de Boneco de neve e sinto a massa do livro em minhas mãos, penso que é um grande suspense que merece ser recomendado pelos clubinhos literários afora.

"Era quando encarava outros rostos a procura de suas dores, seus calcanhares de aquiles, seus pesadelos, motivos e razões pelos quais decepcionavam a si mesmos, enquanto ouvia suas mentiras cansativas e tentava encontrar um sentido no que fazia: aprisionar pessoas que já estavam aprisionadas em si mesmas."

Nota: 3,5 

JÁ O FILME...


A expressão de Michael Fassbender representa a minha assistindo a essa grande pilha de merda saída de alguma caçamba de lixo de Chernobyl. E talvez a dele também, tendo que encarar sua filmografia atualizada. Até Val Kilmer foi parar nessa enrascada.

Não é apenas a velha história de "o livro é sempre melhor que o filme", porque a adaptação cinematográfica de Boneco de neve conta OUTRA HISTÓRIA, e não estou brincando. Adaptaram tanto, cortaram tanto, costuraram tanto, que muita coisa mudou. E, além disso, as coisas acontecem rápido demais, não existe desenvolvimento decente de personagens e situações, parece que alguns cenas foram inseridas e o seu desenrolar completamente esquecido, como se SEI LÁ tivesse acabado grana no meio das filmagens e o diretor chutasse o balde; "vai assim mesmo, quem reparar, foda-se". Até a montagem do filme é prejudicada, ora gerando um ritmo confusamente acelerado, ora não encaixando sequências de ação direito. Se eu fosse o Jo Nesbø, só não estaria chorando e deslizando pelas paredes porque um homem com saldo bancário de seis dígitos não quer guerra com ninguém.

Assista se você não tem nada melhor pra fazer durante duas horas da sua vida ou se você aprecia uma fotografia bonita, porque, sinto muito, Fassbender não aparece em nu frontal em nenhum momento.

Sofrendo de psicose severa em HELLBLADE: SENUA'S SACRIFICE


Descrito por sua produtora britânica Ninja Theory como um jogo "AAA independente", Hellblade foi lançado em agosto de 2017 para PC, PS4 e Xbox One e já ganhou 5 prêmios no BAFTA Games 2018. Sem qualquer prévia da história ou tutorial, a não ser dos comandos dos botões, o game começa com uma guerreira celta em uma canoa em direção a um lugar qualquer, cercada pelos créditos da produção, que navegam tão lentamente quanto ela, já mostrando para o público uma palhinha da magnífica direção de arte. Descobrimos, então, que a guerreira em questão se chama Senua e está em viagem para Hel, um dos nove mundos da mitologia nórdica, a fim de salvar a alma de seu amado e falecido Dillion. De resto, sua história, suas dores e seus sonhos são revelados pouco a pouco, exceto por um detalhe importante e que é o chamariz desse jogo: Senua sofre de psicose severa, e o jogador vai sentir isso junto a cada passo que ela dá, em uma imersão fantástica que une temática celta/nórdica e psicologia.

Levando isso em consideração, se eu tivesse que definir Hellblade em uma única palavra, seria docaralhosombrio. Antes mesmo do menu surgir, e toda vez que você iniciar o game, um aviso desse aparece:


A narrativa de Hellblade começa pouco após a invasão dos vikings na ilhas Orkney, no século VIII, onde a população local de celtas desapareceu após um ataque – eventos que realmente aconteceram na História, investigados pelos realizadores do jogo com a ajuda de um professor de estudos nórdicos da Universidade de Cambridge. Outros profissionais e pessoas também fundamentais para a construção do game foram psiquiatras e pessoas com experiências de psicoses. E é por isso que a coisa toda é bem perturbadora: conseguiram, imagino eu, acertar em cheio nas representações, provocando um mergulho profundo do jogador no inferno pessoal de Senua, que ela chama de "escuridão". A cada enfrentamento de um trama da protagonista, a gente tenta distinguir o que é realidade do que é alucinação, numa atmosfera potencializada pelas múltiplas vozes que ela - e nós - escutamos constantemente. Funcionando mais ou menos como aquela ideia do anjinho e do diabinho nos tentando, elas ora caçoam de Senua, ora incentivam ela a continuar em sua missão e, ainda, ajudam no combate que você terá com inimigos, avisando quando é preciso esquivar, uma vez que não há visão panorâmica nessas horas. Por isso,é ES-SEN-CI-AL que se jogue Hellblade com fones de ouvido, escutando o som em 360 graus. Há momentos em que saber de onde ele tá vindo pode salvar a vida de Senua.

(Também é importante manter o Fisk em dia, já que várias coisas que as vozes falam não têm legenda.)

Trecho do meu jogo

OS PUZZLES, COMBATES E COLECIONÁVEIS


Para chegar a Hel, Senua precisa passar por váaarias portas ao longo do caminho, que se abrem para locais feitos para você explorar e conhecer um pouco mais do que restou daquelas terras e da história de sua família. Porém, como nada é de graça nessa vida, para abrir essas portas é preciso encontrar símbolos espalhados pelo ambiente e remontar cenários – ações que sustentam a imersão na doença da personagem, já que são construídas na base da sua visão distorcida. Nesta exploração, algumas vezes, além das vozes constantes te dizendo pra seguir em determinado lugar ou não seguir, a gente também pode apreciar lá no fundo do headphone um cântico que parece ter saído diretamente da boca do demônio.

Assim, só pra manter o clima, sabe.

Mas beleza. Menina Senua tá seguindo seu caminho e pãnz, quando, claro, encontra obstáculos vivos – conhecidos como brutamontes que emitem sons guturais, armados com espadas e machados. Mas tudo bem, porque nossa pequena grande guerreira foi treinada o suficiente pra conseguir enfrentá-los. O resto é com você. Os combates de Hellblade são, como tudo nessa desgrama de jogo, tensos, mesmo que simples. Os comandos consistem em basicamente se esquivar, se defender com a espada, chutar e realizar dois tipos de golpes. Fazer leitura corporal é prever movimentos do outro e planejar os seus (coisa que demorei a aprender, de afoita que sou). É possível fazer a defesa com sua amiguinha no exato momento em que o oponente te ataca com a arma dele, provocando um contra-ataque de Senua em câmera lenta e, também, é possível congelar o tempo sempre que aparece um símbolo brilhante de amuleto no canto da tela; dessa forma, Senua pode pintar e bordar com os grandalhões por um curto tempo. Fica uma cena de filme bonita de se ver, rapaz (quando ninguém te golpeia na cara). Ah, detalhe: chefões se fazem presentes.

Eu não sou lá essas coisas, eu sei

Os colecionáveis são totens (ou lápides, ou "pedras históricas") espalhados em lugares óbvios e outros nem um pouco óbvios que contam passagens da mitologia celta e nórdica, mesclados ao passado da personagem. Vale a pena tentar absorver o que cada um diz, por mais complexos que possam parecer, pois existe um paralelo com as criaturas que Senua enfrenta e com o que está prestes a acontecer com ela, num geral. E ó que maneiro: se você ativa todos os totens, tem direito a assistir a uma cena extra no final.

MORTE PERMANENTE?


Uma das coisas que mais gerou buzz na época do lançamento é que em Hellblade não há sistema de recuperação de vida. À medida que Senua perde batalhas e desafios, o que o jogo chama de "podridão" começa a subir pelo seu braço, numa clara referência à doença dominando-a pouco a pouco. Se essa podridão chega à cabeça, "tchau, querida": Senua morre permanentemente e o jogador tem que voltar do zero e começar tudo de novo.

No entanto, parece que isso não passa de um blefe. Terrorismo puro. E, se é ou não, funcionou pra me deixar ainda mais nervosa durante o gameplay. Eu diria que é uma ideia genial; mais uma forma de o game brincar com a nossa mente sem que saibamos se aquilo é real ou não, assim como acontece com Senua.


Sobre outros aspectos, bora aplaudir de pé o gráfico e direção de arte de Hellblade, que são apavorantemente bonitos. A tecnologia de captura de movimentos utilizada na protagonista, aliás – ao contrário dos outros jogos, em que existe um longo processo de meses de trabalho –, pôde ser feita em tempo real, capaz de reduzir um bom número de etapas. É impressionante que um time de cerca de 20 pessoas tenha desenvolvido algo tão... TÃO, e com baixo orçamento, rendendo prêmio no Siggraph, a maior conferência de computação gráfica do mundo. Outra coisa que me deixou bege em relação à equipe é que Melina Juergens, quem emprestou a voz e a aparência para dar vida à Senua, não era atriz e nunca tinha passado por uma experiência assim antes. Ela cuidava da edição de vídeos da Ninja Theory e, aos poucos, com uma ajuda aqui e ali e uns testes cá e acolá, acabou com este cargo nada importante, se preparando física e mentalmente num longo laboratório. O trabalho vingou, já que Melina conquistou o BAFTA de Melhor Desempenho neste ano. Recomendo assistirem ao diário do estúdio desenvolvedor, que conta essa história melhor e fará você se apaixonar por ela.

Antes de deixar você louco de vontade de jogar Hellblade, eu não poderia deixar de dizer algo, a meu ver, bem importante: mais do que criar as representações da psicose para nos desestabilizar enquanto jogadores, o game promove através dessa experiência de Senua uma empatia absurda por ela, fazendo com que tenhamos ao menos uma noção do que é viver sob essa condição, e gerando um grande apelo emocional que une narrativa brilhante e personagem cativante. No menu principal do jogo, você ainda pode assistir a um pequenino documentário sobre psicose.

Existe um discursos de aceitação muito bonito sobre abraçar a própria escuridão. Não só em relação a si, como aos outros, e o que de bom, mas o que principalmente de ruim, acontece em nossas vidas. Afinal, o que não nos mata, nos fortalece. E, se não matou, resta seguir em direção a novas histórias, mas com novos pés.

"As pessoas pensam que o mal é uma força sobrenatural invisível e invocam os deuses por proteção. Mas o mal pode vir da mão por trás dos deuses; uma mão familiar, fria e cruel."

Nota:

HEREDITÁRIO: 0% jumpscares, 99% perturbador, 1% vagabundo


Comentários sem spoilers


Eu quero começar este texto mais uma vez enaltecendo o estúdio A24, responsável por distribuir os excelentes Moonlight, Lady Bird, A ghost story, Ex-Machina, Projeto Flórida e O lagosta, entre outros, também conhecido por dar liberdade criativa aos autores de seus projetos. Ultimamente, este nome tem ficado forte por lançar alguns filmes de terror que fogem das produções de sustos baratos, como Ao cair da noiteeA bruxa. Hereditário é mais um, graças aos deuses, que chegou para engrossar o grupo.

Esses "novos filmes de terror", como eu os encaixava até pouco tempo, na verdade não estão inventando a roda, e sim trazendo-a de volta para o cinema. É um retorno ao horror clássico muito feito há várias décadas, como O exorcista e O bebê de Rosemary, afirmando que a sétima arte vive momentos cíclicos. Não à toa, Hereditário vem sendo descrito, desde sua aparição no Festival de Sundance, como o "novo O Exorcista"; não em termos de trama, mas em termos de narrativa, com a faca, o queijo e a goiabada na mão pra se tornar um novo clássico do gênero neste século.

A história do filme não é originalzona. Mas a forma como ela é contada é a grande sacada. Acho que Hereditárioé um bom exemplo de como a experiência do espectador ao longo da projeção é tão ou mais importante que a conclusão dela. Desde o início existe o prenúncio de uma tragédia, como uma semente plantada na nossa viagem sensorial que cresce e floresce a cada cena e detalhes nem um pouco apresentados ao acaso, nos provocando a montar um quebra-cabeças.

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A primeira e elegante cena do filme
Tudo começa com a morte da reclusa matriarca dos Graham, que, mesmo longe de cena, tem sua sombra ainda pairando sobre a família, principalmente sobre a solitária neta adolescente, Charlie, de quem ela sempre foi extremamente próxima. Em meio ao enfrentamento do luto de diferentes formas pelos personagens - mãe, pai, filho e filha -, uma nova tragédia abala os elos que os unem e transformam suas vidas em um crescente pandemônio.

Isso é tudo o que você precisa saber pra assistir a Hereditário. O famoso"quanto menos, melhor". O importante, aqui, é não ter muita noção de que momentos te deixarão com aquela freada na cueca. Volto a enfatizar: Hereditário NÃO tem jumpscares, mas trabalha de forma brilhante uma atmosfera de tensão, angústia e medo através do roteiro, montagem, atuações, trilha sonora, mixagem de som, design de produção e direção, obviamente. No cy da plateia no cinema não passava nem sinal de wifi. 

A estética do filme é essencial em sua narrativa. A maneira simples, mas inteligente, como a fotografia trabalha as imagens, a luz e a sombra provoca sensações muito mais sufocantes e assustadoras em nós do que uma trilha aumentada no momento "certo", junto da aparição "repentina" de um monstrinho ou de um cara com máscara e serra elétrica na mão. O som, aliás, funciona muito bem em Hereditário tanto nos ruídos incômodos para acelerar nossa ansiedade, quanto nos silêncios perfeitamente colocados nas cenas que, ao invés de proporcionarem alívio, conseguem desconforto. Parecia que o diretor, Ari Aster, sabia exatamente o que estava fazendo em cada segundo de filme, que, a propósito, é o primeiro longa no currículo do filho da mãe.

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"Essa vai pro álbum, amor"
Me impressionou como o design da casa da família, ainda que propositalmente grande para os personagens - num paralelo às maquetes em que a esposa/mãe trabalha -, tenha transformado as interações entre eles em casulos claustrofóbicos, potencializados pelas performances dos atores. Milly Shapiro, por exemplo, quem interpreta a garota Charlie e ilustra a capa deste post, a princípio incomoda por sua aparência, mas simultaneamente intensifica nosso mal estar enquanto público por conta de seu comportamento bizarro (ouça na sua cabeça o "cloc" que ela faz com a língua constantemente) e fragiliza a personagem, deixando-a muito mais humana, e não a típica criança assustadora de filmes de terror. Alex Wolff, como o irmão mais velho, Peter, traz reações genuínas de puro pavor, desespero e angústia, seja em cenas explosivas ou que requerem uma internalização do sofrimento. Gabriel Byrneé Steve, o pai da família e ponto sensato que nos conecta com o aspecto racional da coisa e que, com poucas e sutis expressões faciais, transmite a preocupação com o rumo que a rotina dos Graham está se transformando, além do carinho pela esposa e filhos. Ann Dowd, quem participa fora desse núcleo, eu já considero maravilhosa desde Compliance, The leftovers e The handmaid's tale (TIA LYDIA QUE A SENHORA POSSA ABRIR) e aqui é sensacional como esta mulher de respeito trabalha seus olhares e gestos calorosos que parecem conter, num segundinho e outro, algo de ameaçador e cínico. A cereja do bolo (e que cerejão, bicho) é a Toni Collette, a esposa/mãe Annie. Eu sei que o Oscar é um desgraçado e tem poucas chances de nomear esta atriz em 2019, mas que ela merece muitos prêmios, merece. Em uma única cena de Hereditário - que envolve um jantar a três -, ela consegue variar com honestidade emoções contrárias da personagem, saindo do autocontrole forjado à erupção em poucos minutos. 

Apesar de eu ter saído da sessão como se tivessem sugado minhas energias e secado todas as pimenteiras num raio de 1km do shopping, o 1% vagabundo do filme fica por conta de seu terceiro ato, que perde a sugestão e a intensidade que vinha trazendo até então. Não que seja suficiente pra "estragar" tudo o que foi construído, mas existem alguns clichês de gênero que, em plena era de youtuber ganhando dinheiro com banheira de Nutella, não têm impacto sobre o público.


PODEM ENTRAR, SPOILERS



Se você NÃO assistiu ao filme ainda, não leia esta parte do texto e pule para o último parágrafo da página. Se, ainda assim, você quer prosseguir por aqui e estragar sua experiência, merece um pescotapa.

Hereditário, como os outros filmes de terror da A24, traz subtextos enriquecedores para a trama. Se formos olhar para a camada de cima, a superficial e que está escancarada na tela enquanto assistimos, a história toda começa antes da Ellen, a avó da família, falecer. Os Graham, ou melhor, os Leigh - antes de Annie se casar com Steve Graham -, possuem um triste histórico de doenças mentais. Ellen foi diagnosticada com transtorno dissociativo de personalidade e demência, o que causou um distanciamento entre ela e a filha; o marido sofria de depressão psicótica a ponto de morrer de inanição, por se recusar a comer, e o filho esquizofrênico se matou depois de várias tentativas da mãe de "colocar pessoas dentro dele". Isso, aliás, tem tudo a ver com a vida secreta de Ellen anos atrás: ela era líder de um culto satânico que tinha como objetivo trazer à terra Paimon, um dos nove reis do inferno, que, para isso, só poderia ocupar um hospedeiro do sexo masculino. Ou seja, se não deu certo com o filho suicida, teria que dar com o neto.

O problema é que, por causa do afastamento de Annie em relação a Ellen, Peter foi criado longe da avó. Mas, mesmo que Annie confesse em determinado ponto do filme que tentou abortar Peter de diversas formas, o culto, de alguma maneira, conseguiu que ele nascesse. Foi na segunda gravidez que, tomada pela culpa dos anos de distância, Annie deixa que a mãe tome conta da filha Charlie. É aí que, desde o nascimento, Charlie se torna Paimon e a relação das duas passa a ser de adoradora do tinhoso e tinhosinha, e não avó e neta, numa obsessão de criar a criança praticamente sozinha para que os planos do culto aconteçam como planejado.     

O fato de Charlie ser uma menina "indesejada" pela avó é refletido na cena em que ela diz pra mãe que Ellen queria que ela fosse um menino, e em seu próprio nome, Charles - essencialmente masculino -, bordado em um dos capachos feitos pela senhora. Mas o prosseguimento do ritual no corpo masculino encontra sucesso após a morte de Charlie, quando Paimon digivolve chegando, enfim, a Peter. A partir do momento em que Annie aceita realizar o contato com o mundo espiritual através do passo a passo de Joan (Ann Dowd), outra membra do culto, o espírito/demônio tem liberdade de possuir outros corpos, uma vez que foi libertado de Charlie através da decapitação, passando pela Annie (morta da mesma forma) e chegando ao garoto.

Linda história.

A hereditariedade do título do filme, nesse contexto, se relaciona com esse mal passado de pessoa pra pessoa na família. Inclusive, existe uma cena no início da trama em que Peter está em uma aula de literatura estudando justamente tragédia grega, em que professor e alunos discutem sobre as pessoas serem meros peões em um cenário no qual não existe saída. Isso pode ser tanto uma interpretação para a família Leigh-Graham, já que desde antes das crianças nascerem os admiradores do capiroto já os observavam e tinham planos para eles, quanto pode ser para o subtexto de doenças mentais. Essa seria a camada de baixo do filme.

Sabemos que depressão e esquizofrenia, entre outras, são hereditárias, e sabemos que os antecedentes de Annie sofriam dessas doenças. Logo, se são fatores genéticos que as determinam, Annie pode ter começado a manifestar sintomas de alguma doença mental, assim como Peter, já que ambos têm alucinações provavelmente desencadeadas pelo trauma da perda. Peões em um cenário sem saída ou, sendo mais sofisticada, bonecos em uma maquete. A alegoria da maquete nesta interpretação me soa incrível, se consideramos que ela representa uma caixa onde os habitantes são bonecos frágeis e manipuláveis, "presos", que não têm como escapar de sua herança. Além disso, não é só o trabalho através do qual Annie expressa suas emoções e tem algum controle sobre a situação, como representa o ponto de vista dela sobre a história. Lembram que a primeira cena do filme é a câmera entrando, literalmente, dentro de uma miniatura de casa para começar a narrar? Dessa forma, não é por acaso que Steve, o pai, mostra-se o único são daquele lugar. Afinal, se as doenças são hereditárias e ele não tem o sangue da família Leigh, faz todo o sentido estar imune.

Hereditário pode ser um filme sobre possessão, sobre enfrentamento do luto, culpa e sobre os demônios - os figurativos - que você carrega e passa para frente.


Apesar da frase "Este filme não é pra todo mundo" soar arrogante, estou cada vez mais certa de seu valor. Filmes que dividem opiniões geralmente me chamam a atenção, e, no caso de Hereditário, colecionar ótimas críticas de especialistas e não ser sucesso com o público que não curte trabalhar a massa cinzenta já é quase garantia de ser bom. Recomendo fortemente que você assista no cinema de cabeça aberta e livre de spoilers, para ter uma experiência completa e passível de julgamento justo.

FUCK THE POLICE, FUCK THE PEOPLE: IN A24 AND ROTTEN TOMATOES WE TRUST.


Nota:



Duas horas emocionantes na pele de CAPTAIN SPIRIT


Em maio do ano passado, a equipe criadora de Life is Strangedivulgou um vídeo comemorando os 3 milhões de cópias vendidas, aproveitando para anunciar que o game, pela glória de Kate Marsh, ganharia uma segunda temporada, cujo desenvolvimento começou logo após o lançamento da mídia física do jogo original. Meses depois, uma nota discreta dizia que teríamos novidades sobre isso logo; motivo suficiente para Strangers (prazer) do mundo todo ficarem de orelhinhas em pé com a Electronic Entertainment Expo, carinhosamente (rs) conhecida como E3. Pra quem não sabe, o evento é o maior de games do mundo, e, pela primeira vez em três anos, a Square Enix, distribuidora de Life is Strange, apresentaria um painel com novidades. Com isso, os rumores de um teaser, trailer ou qualquer migalha sobre o jogo novo eram bem fortes, vinhado. 

Quem costuma acompanhar tudo o que sai na mídia a respeito dele sabe que a temporada nova não será com as mesmas personagens. E, para a nossa surpresa, pouco antes da E3 tivemos uma notícia, sim, mas com o anúncio de uma demo de Life is Strange 2 chamada The awesome adventures of Captain Spirit. Segundo Michel Koch, co-diretor e diretor de arte de Life is Strange na desenvolvedora DONTNOD, esse minigame é um elo entre o primeiro jogo e o segundo e, à primeira vista, gira em torno de uma manhã de um sábado qualquer na vida de Chris, um garoto de 10 anos que tem imaginação de sobra pra transformar tudo à sua volta em mundos inteiros pra explorar. Koch disse que é um convite para sairmos da nossa rotina, que, muitas vezes, esquece como é a sensibilidade de uma criança, a fim de voltarmos um pouco à infância e sermos acertados em cheio pela nostalgia.

Bom, ele estava certo. Funcionou.


Mas DONTNOD é DONTNOD, e esse game poderia ser tudo, menos superficial. Lançado oficialmente e mundialmente dia 26 de junho, de GRAÇA - um presente para os fãs, disseram - , para Xbox One, Playstation 4 e PC (Steam), The awesome adventures of Captain Spirit confirma a que veio a agora franquia Life is Strange: criar um retrato delicado de dramas humanos que, de forma muito natural, faz com que o público se veja refletido em personagens e situações tão comuns da vida real. Ou, no mínimo, que provoque empatia em nós. Essa é uma reação geral entre jogadores impactados pelo game; mesmo a primeira temporada sendo focada em adolescentes, basta ver como os fãs não se resumem a eles e pertencem a gerações diferentes em inúmeros aspectos. Life is Strange trata da linguagem universal da empatia, e não de poderes sobrenaturais. A habilidade de voltar no tempo da primeira protagonista, Max, é "só" uma ferramenta para explorar o perdão, a perda, a compreensão, a amizade, a bondade e a nossa capacidade de ir além dos limites para preservar quem mais amamos.

(puta que pariu, DONTNOD, e eu não tô nem recebendo pra escrever isso)

Em Captain Spirit, isso também se faz presente, de uma forma diferente. Com a mesma equipe de Life is Strange, envolvendo Raoul Barbet, Koch e o roteirista Christian Divine, foi evocado na demo o melhor da franquia em termos narrativos: uma fotografia linda, uma trilha sonora escolhida a dedo para reforçar a imersão do jogador, personagens cativantes e uma boa e bem contada história. Captain Spirit tem em torno de apenas 2 horas de duração, mas deve dar um banho de envolvimento em muito jogo longo por aí. Um banho bem dado. Com espumas. E Monange.




O QUE MUDA E O QUE NÃO MUDA NA JOGABILIDADE


Primeiro: não é necessário ter jogado Life is Strange para conferir esse aqui. Captain Spirit ainda é um point and click, mas com mais "liberdade". Pra começar, ele não é linear: você está livre para ir e vir quantas vezes quiser dos ambientes. Também continua no esquema de "suas escolhas e ações afetam o desenrolar", porém, com um plus: certos momentos e interações com outros personagens podem ser perdidos dependendo do que você faz ou deixa de fazer, como responder prontamente ou não ao chamado do pai do Chris para o café da manhã. E mais: é possível concluir o game com poucos MINUTOS se você fizer o garoto tomar x atitude, mas, obviamente, você perde demais da história. Se quiser a dica pra isso não acontecer, arraste o mouse até o ponto final: em determinada cena, o pai diz que você pode acordá-lo caso ele durma assistindo ao jogo na TV. Simplesmente não o acorde até terminar todos os desafios do jogo.   

Existe mais autonomia nos diálogos também, com mais opções de respostas que mudam a trajetória. Além disso, eles têm timming, similar ao que ocorre em jogos da Quantic Dream e da Telltale: se você não escolhe a resposta dentro do prazo, o jogo escolhe por você.

Ah, e se em Life is Strange havia um "botão mágico" para fazer Max voltar no tempo, aqui ele serve para Chris realizar algumas tarefas com uma espécie de turbo do alter-ego Captain Spirit, bem nos moldes de como uma criança brinca de super-herói.

Confirmadamente inspirado em Sailor Moon


EASTER EGG É BOM E A GENTE GOSTA


Michel Koch já tinha alertado a galerinha que em Captain Spirit encontraríamos easter eggs que o ligassem a Life is Strange, além de pistas para Life is Strange 2. Meu sonho de princesa que Max ou Chloe aparecessem caminhando ao fundo de algum cenário? Sim. Mas até mesmo uma iludida com ascendente em trouxa reconhece limites. (mentira)


Voltar no tempo pra esquecer esses jogos e começar tudo de novo? Check.


Vejam só quem também estudou em Blackwell.


Um urso caolho, pirata e com três cartuchos de bala no peito (alô, Chloe)? Opa!


Lembra do urso caolho da Max, chamado Capitão?


Bom, pelo menos ninguém me mandou catar as latas de cerveja num muquifo onde nem o Google Maps poderia me achar caso eu me perdesse.


O gostosão Hawt Dawg Man está por toda parte em Captain Spirit, inclusive em um joguinho bem MANEIRO que bota Flappy Bird no chinelo:



E, bem... é. Ouch. *TRIGGERED*


Isso foi no primeiro episódio de Life is Strange.


DONTNOD: A MESTRA DA SUTILEZA


Como foi em Life is Strange, aqui boa parte da história é contada nos detalhes. Um bom jogador da franquia sabe que explorar cantos e interações levam a recompensas. ABRA SEUS ÓLEOS. É a força das sutilezas dessas narrativas que as tornam tão memoráveis e absorvíveis.

Captain Spirit esconde no universo lúdico de Chris um escape e os maiores medos e desejos do menino, uma também poderosa forma de trabalhar sua personalidade. Repare os monstros, vilões, combates e cenários montados em sua cabeça e perceba quem e o que representam no mundo real. Como muita coisa nos jogos, é preciso ir além da primeira camada. E isso vale também para os personagens: todos são multifacetados, evitando que o jogador caia na facilidade de odiar determinada pessoa por suas atitudes claramente reprováveis. Nada é preto no branco.


The awesome adventures of Captain Spirité uma carta de amor da DONTNOD aos fãs, um game lindo e uma jogada de marketing inteligente; afinal, como já diziam os poetas de supermercado, é de uma degustação grátis que vem a compra. Eu espero que a demo chegue cada vez mais a pessoas diferentes por esse motivo, para que a palavra de Life is Strange seja multiplicada e, a empatia, idem.

O anúncio de Life is Strange 2 saiu junto com Captain Spirit, afinal (arrancamos os cabelos e teorias saíram do forno nos dez minutos seguintes). O game, inclusive, já está em pré-venda e o episódio 1 de 5 será lançado no dia 27 de setembro.

Nota:




4 documentários de crimes que vão te deixar puto da vida


Antes de começarmos, um aviso do bem: todos esses documentário estão na Netflix. AEAEAEAE!


A plataforma pode até estar deixando a desejar com seus filmes originais, mas no quesito Documentários a gente pode nadar de braçada que o catálogo tá cheio de coisa boa. Eu amo o gênero, especialmente obras que tratam de crimes, processos legais, ~mistérios e por aí vai. E, entre essas histórias incríveis de crimes, depois de contabilizar um punhado na minha listinha de assistidos, achei bem curioso que várias delas de fato são de deixar o espectador puto da vida ao mostrar erros grotescos, conspirações do sistema penal e julgamentos midiáticos que acabam prejudicando a vida de inocentes ou inocentando criminosos. Já falei de alguns deles no blog, como os casos retratados em Making a murderer e Os três de West Memphis (também pretendo escrever sobre O.J Simpson em breve), e agora trago novos quatro documentários na mesma vibe:


Gênio diabólico



O caso "Brian Wells" ou "The pizza bomber" aconteceu em 2003 e é quase um Jogos Mortais da vida real. Lá na Pensilvânia, nos EUA, o entregador de pizza Brian, sem antecedentes criminais, roubou um banco usando uma bengala disfarçada de arma e uma bomba presa ao próprio pescoço. Ele tinha instruções para a entrega do dinheiro aos "mandantes do crime" antes que a bomba detonasse, mas antes de cumprir a última tarefa do extenso bilhete, a polícia já tinha cercado a rua, levando a consequências tristes devido a, meu ver, um despreparo sobre como lidar com aquela situação específica.

Num lenga-lenga de burocracia em que a polícia federal atrapalha a estadual, que atrapalha a municipal e que volta a atrapalhar a federal pra ver quem lida com quais aspectos do caso, a investigação envolveu até o FBI e deixou passar evidências logo no início da confusão (usando um eufemismo). Depois, num caso paralelamente apurado, coincidências levam os responsáveis a dois suspeitos misteriosos e cheios de segredos.

Gênio Diabólicoé dividido em 4 episódios de 45 minutos.


Sombras da verdade



Também com 4 episódios, essa minissérie documental não me deixou dormir direito. Fiquei puta da vida, sim, mas também extremamente assustada e triste. Esteja preparado para injustiças e reviravoltas macabras.

Em 2006, a garota israelense Tair Rada foi encontrada morta brutalmente no banheiro da escola onde estudava. Não demora muito para que a polícia local sofra uma pressão absurda pra encontrar o assassino, e sabemos que isso pode não acabar nada bem. É assim que um funcionário ucraniano temporário da escola é acusado com provas circunstanciais, culminando numa confissão cheia de furos e incertezas, me lembrando demais o que aconteceu em Making a Murderer.

Além de material da investigação da época, Sombras da verdade conta com depoimentos atuais dos envolvidos, incluindo a família de Tair, a polícia e amigos da menina, além do desenrolar depois do que a polícia israelense achou ser a conclusão do crime. O storytelling do filme deixa o espectador em estado de imersão, potencializado pelos detalhes absurdos da história que vão se revelando. Não dá pra dizer muito além disso, pra não estragar surpresas.


MEDO DO 13



Putaça porém terminei esse documentário chorando???

Não se trata da curiosa fobia do número 13. O título fica por conta de um detalhe da história fantástica de Nick Yarris, o cara da foto que carrega esse filme nas costas no melhor sentido que existe, e que engrandece ainda mais tudo o que ele conta ao longo de 1 hora e 36 minutos. Basicamente através de depoimentos dele, capazes de construir uma narrativa riquíssima sem depender de outros registros e materiais, a gente vai descobrindo pouco a pouco as razões que o levaram a querer ser executado antes da hora. Yarris, aos 20 anos, foi condenado à morte nos EUA, e passou 23 anos em confinamento solitário.

O roteiro, a montagem, a não linearidade e até a sonoplastia de Medo do 13 vão te fazer ficar pistola em alguns momentos, mas, também, vão emocionar e te deixar apaixonado pela vida. Ou algo bem perto disso.


The Staircase (Morte na escadaria)



Por volta de 2h40 da manhã de 9 de dezembro de 2001, o romancista Michael Peterson liga para a emergência desesperado pedindo ajuda para a esposa, que, segundo ele, havia caído das escadas e ainda respirava. Quando a polícia e a equipe médica chegam ao local, cinco minutos depois, era tarde demais e a vítima estava morta. A quantidade de sangue ao redor do corpo era assustadora. Para os investigadores, os fatos falavam por si: não se tratava de um acidente. Uma semana depois, Michael é preso. Assim começa uma viagem singular por 12 episódios, em busca da causa da morte de Kathleen Peterson.

Inicialmente, a série documental tinha 8 episódios, mas ganhou mais três novos por causa de algumas reviravoltas nessa história intrigante que, olha, veado, me deixaram fora de mim. Cada um vai julgar Michael de uma maneira enquanto absorve os relatos de testemunhas, as provas, as teorias e a condução do julgamento em si, mas, independente de veredictos, é descarada a maneira podre como o Estado faz de tudo pela incriminação, ao invés de verdadeiramente desvendar o que aconteceu. O que vale, aqui e em muitas outras situações (muitas retratadas em outros documentários), é "ganhar o caso", mesmo que seja preciso passar por cima da ética. 

Eu puxei meus cabelos. Xinguei o juiz (rs). Chutei as cobertas, babei raivosamente no travesseiro, soquei as paredes, perdi a esperança na humanidade e quero repassar isso para a frente, para não sofrer sozinha. 

O BAZAR DOS SONHOS RUINS, livro de contos de Stephen King


Alô, alô, Terezinha, voltando à TAG de Livros com mais uma obra dele, este senhor cheiroso, rico, amante do Maine, dono de um maxilar de personalidade e que já adaptou 80 de seus 70 livros publicados.

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Olar
Lançada neste ano pela Suma de Letras, O bazar dos sonhos ruinsé a mais nova coletânea de contos e poemas de Stephen King que eu achei que iria me atropelar de frente e depois de ré, mas no máximo deu uma buzinada e eu acenei sorrindo.

A capa do livro é uma belezura só, talvez uma das mais bonitas das obras dele lançadas pela editora, mas, pra mim, trouxe vários dos contos mais fracos do mestre. O que comentar dos poemas, que preferi arrancar meus olhos com uma lixa de unha do que terminá-los? Quer dizer, depois que você lê um Quatro Estações da vida, que contém O corpo (adaptado para Conta comigo) e Rita Hayworthe a redenção de Shawshank (adaptado para Um sonho de liberdade), você fica com as expectativas um cadim elevadas, sabe como é.

O primeiro conto da lista, Milha 81, abre bem as cortinas e me deu aqueeela animada. Afinal, a história é sobre um fucking carro abandonado que COME GENTE. Ou seja, potencial pra muito mais coisa maravilhosa pela frente, né? Bom, nem tanto. King tem um puta talento pra te envolver logo no início de suas narrativas, mas, como ele mesmo sabe, finais não são o seu forte, e vários de seus contos aqui sofrem disso. Eu tarra lá, agarrada nas páginas, contando quantas faltavam pra terminar, pra chegar no próximo da fila, gritando E AÍ, E AÍ, E AÍIII?, e aí, nada.

Em compensação, personagens bem escritos, que são uma de suas marcas, estão em O bazar. E, entre muitos contos sobrenaturais, você vai se deparar com alguns bem-humorados e outros que podem gerar uma reflexão interessante sobre moralidade, valores da sociedade, ganância, obsessão e até amor.

Dos mais de 18 títulos aqui, destaco meus favoritos:
  • Duna (que tem um final ótimo!!111)
  • Garotinho malvado
  • Moralidade
  • Indisposta
  • UR
  • Fogos de artifício e bebedeira
  • O pequeno deus verde da agonia
  • Obituários
Eu diria que, ao invés de sonhos ruins, tive um bazar de melhores passatempos em viagens de ônibus ao trabalho. É óbvio que está recomendado. Porque, mesmo com obras esquecíveis, Stephen King é Stephen King. Adivinha de quem é o livro que estou lendo atualmente e que em breve vai ganhar textinho aqui? Touché


OUTSIDER, o mais novo romance policial (será?) de Stephen King


Tirando uma cena razoavelmente baranga de Um amor para recordar, em que o mocinho do filme realiza o sonho da mocinha de estar em dois lugares ao mesmo tempo simplesmente se posicionando na divisa entre duas cidades, físicos continuam debatendo a possibilidade desse princípio. Em Outsider, você provavelmente vai se juntar a eles.

Concluído em maio deste ano pelo autor que mais dá as caras neste blog e na minha estante, Stephen King, o livro alcançou o primeiro lugar na lista de mais vendidos da Publishers Weekly, além de passar semanas entre os bestsellers do New York Times. No Brasil, traduzido e lançado rapidamente pouco tempo depois, ele entrou no ranking da Veja, da Folha e do PublishNews. Além de ter nascido campeão de vendas, Outsider já teve os direitos comprados para virar uma série de 10 episódios, roteirizado por Richard Price, responsável pelo sucesso The wire, da HBO. Tá bom ou quer mais, poc?

Fiz meu pedido na pré-venda, como boa escrava do King que sou, e em poucos dias recebi meu cheiroso exemplar com uma capa lindérrima, baixo relevo, título original e tudo (ótimo pra fingir no ônibus que está lendo livro em inglês). Logo nas primeiras páginas, fui conquistada pela costurinha de narrativa que o King faz, se assemelhando um pouco com o que acontece em Carrie, a estranha, que é intercalar acontecimentos do presente com transição de depoimentos à polícia de Flint City, a cidade fictícia da trama. Aos poucos, descobrimos que lá aconteceu o assassinato horrendo de uma criança, morta a dentadas e estuprada com um galho de árvore, cujo principal suspeito é o cidadão exemplar Terry Maitland, professor da liga infantil de baseball local (inclusive, da vítima). As digitais incontestavelmente compatíveis com Terry encontradas no local e a natureza abominável do crime levaram os policiais a prenderem o professor diante de mais de mil pessoas, incluindo a esposa e as filhas, gerando uma comoção na população. No entanto, tão irrefutável quanto as provas físicas de sua culpabilidade, um álibi se revela na história: no dia e horário do crime, Terry Maitland estava em outra cidade, junto de outras pessoas, em uma conferência literária.

E aí: uma pessoa pode estar em dois lugares ao mesmo tempo?


A maior referência para Stephen King escrever este livro, além de uns folclores latinos, foi o conto William Wilson, de Edgar Allan Poe, sobre a história de um rapaz que encontra, logo no primeiro dia de escola, um colega com o mesmo nome que o seu. Mas as semelhanças não se limitam ao nome, em tudo eles são iguais: na forma de agir, na forma de andar, na forma de falar e de se vestir.

O mistério se foi Terry ou não o assassino se mantém basicamente em toda a primeira metade de Outsider, nos moldes de um romance policial com que estamos acostumados. Investigações, depoimentos, advogados se estranhando e o impacto do acontecimento nas famílias de Flint City, especialmente a do menino morto e a do acusado, intensificado pelo poder que a mídia trouxe ao caso e pelo famoso e terrível fenômeno "fazer justiça com as próprias mãos". Em uma cena icônica, por exemplo, a tal comoção da população é elevada à décima potência graças à espetacularização gerada com a prisão pública de Terry, culminando numa reviravolta que, se eu fosse julgar pela reação de alguns leitores, seria o plot twist mais genial da última década. (mas... né não) A partir daí, Outsider vai por os pezinhos no terreno do fantástico e sobrenatural.

Céticos x crédulos: é melhor considerar que existem MUITO mais coisas entre o céu e a terra do que sonha a nossa vã filosofia para resolver um crime como esse? É a "batalha" que se inicia na segunda parte do livro, com a entrada surpreendente de um personagem da trilogia Bill Hodges que me incomodou em alguns aspectos. Primeiro, que li apenas Mr. Mercedes, o primeiro livro da trilogia, e levei vários spoilers na fuça. Segundo, que o personagem me atrai e me afasta dele na mesma proporção. Terceiro, que foi um deus ex machina do caralho. "Meus consagrados, entrei aqui na história pra resolver o probleminha de vocês fazendo umas pesquisas no Wikipedia, assistindo a um filme B latino e supondo um zilhão de coisas e OLHA, num é que eram todas verdade mesmo? Que coisa!"

Pra mim, a trama foi perdendo força exponencialmente. A resolução do caso só não foi decepcionante porque me lembrou várias outras resoluções meio preguiçosas e sem peso do King em seus livros, e felizmente estou vacinada e acostumada.       


No entanto, bato palmas, como sempre, pra construção de personagens que muso faz. Ralph Anderson, o detetive pé no chão que acaba se revelando protagonista da história, pra mim não é dos mais carismáticos da sua extensa carreira, mas possui um arco que funciona muito bem. Entendemos suas razões de ser "odiável" no começo de Outsider (que pai de família não ficaria enojado e louco para expor o monstro assassino de crianças que poderia por em risco outras vidas?) e somos agraciados por sua redenção, enquanto ele confronta suas próprias crenças e culpa de ter cometido erros de consequências desastrosas. 

NOVO MEMBRO NO HALL DE MAIORES VILÕES DO KING?

Há quem diga que o vilão de Outsider merece esse título. GRRRRLL, NOPE! Ele não é podre como Rose, A Cartola, mas passa loooonge de um Pennywise ou Annie Wilkes, além de ter me causado déjà vus em relação ao seu modus operandi.

Considerando que o último livro (no sentido de lançado mais recentemente) foda de verdade do King foi Novembro de 63, na minha opinião, estou com um cadim de saudades do autor que ele foi nos anos 1970 e 1980. Deus me dibre de desejar que ele volte a enfiar a cara nos chazim de cogumelo e na cachaça pra escrever coisas louconas, mas a sensação neste momento é a de que os melhores livros dele foram desenvolvidos naquela época.

"Não há fim para o universo."

Ficha técnica
Editora: Suma
Tradutora: Regiane Winarski
Páginas: 528
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Com personagens inéditos, LIFE IS STRANGE 2 fala de xenofobia


Eu estou atrasada com pelo menos três publicações sobre os últimos games que joguei (Until Dawn, To the moon e Detroit: become human), mas quem me conhece sabe que qualquer coisa de Life is Strange tem prioridade neste recinto.

Se é a primeira vez que você está no meu blog, é mentira que eu atraso posts, tá?

Bom, cremosos e cremosas, é isso aí! A continuação do universo criado pela francesa DONTNOD e publicado pela Square Enix finalmente foi lançada, com o seu primeiro episódio, no dia 26 de setembro, para PC (Steam), PS4 e Xbox One. Depois de muito especulado após o lançamento de Captain Spirit em maio – demo GRATUITA que liga Life is Strange 1 ao 2 –, muita gente descobriu que os novos protagonistas do game são dois irmãos, e não o menino Chris. (Quer dizer, gente que não viu trailers ou não acompanhou as novidades, risos.) É difícil se despedir de Max e Chloe. Mas, enquanto elas continuam vivas nos trabalhos de fãs, na HQ que sairá em breve e, talvez, na série live action da qual ninguém mais ouviu falar desde 2016, é hora de dar as boas-vindas a Sean e Daniel


O QUE MUDA OU NÃO EM RELAÇÃO À PRIMEIRA TEMPORADA



A primeira coisa que o jogo te pergunta quando você o roda, é se você jogou Life is Strange 1. Se sim, a pergunta a seguir é qual dos finais você escolheu. Não é necessário ter jogado a primeira temporada para curtir esta daqui: se você a concluiu, Life is Strange 2 seguirá a rota segundo o seu final escolhido, mas, se não, o game seguirá uma das rotas automaticamente. Mesmo se passando 3 anos depois do que aconteceu em Arcadia Bay, a história dos irmãos tem sutis ligações com alguns pontos da história anterior (pelo menos, neste primeiro episódio). Falarei das referências à Life is Strange 1 mais pra frente.

Dito isso, uma das coisas novas que percebemos nos primeiros minutos do game é em relação ao gráfico. É notável como ele está mais caprichado; as feições estão mais expressivas e os movimentos dos personagens, mais naturais (inclusive dos cabelos). A direção de arte continua uma belezura, com um trabalho de luz magnífico e tomadas cinematográficas de encher os olhos. Além disso, a sincronia das falas com a boca melhorou pra caramba. 


Os diálogos parecem mais críveis no aspecto "adolescentes conversando", o que é fácil de notar quando, ainda no início do game, Sean e sua BFF Lyla batem um papo sobre festas, sexo, drogas e futuro. Ponto também para a legenda em português, que adaptou algumas expressões para nossas gírias daqui, como "sextou".

Life is Strange 2 continua sendo um jogo de escolhas mas, claro, sem os poderes de voltar no tempo. Além desse peso, suas decisões influenciam não só a sua jornada, como o comportamento do Daniel. Vamos lá: é que, na história, os irmãos são obrigados a fugirem de casa depois que uma tragédia acontece, e a sobreviverem por conta própria. Sendo assim, Sean, como irmão mais velho, precisa proteger o caçula, e todas as suas atitudes (roubar, mendigar, agir com violência ou escárnio, não deixar ele aprender coisas por conta própria, etc.) influenciam a pessoa que ele se tornará. Pode parecer fácil, tipo "preto ou branco", mas nos contextos não é tão simples discernir entre o certo e o errado. Ao final do episódio, na familiar lista de estatísticas de escolhas suas vs. escolhas dos outros jogadores, é possível saber como o garoto foi influenciado pelo seu bom ou mau exemplo.

Quanto à jogabilidade, Life is Strange 2 também é um jogo point and click, mas com algumas novidades. Assim como em Captain Spirit, em alguns momentos há timing para você reagir a um personagem e, dependendo do que você faz ou deixa de fazer, acaba perdendo algumas interações. Você também vai se deparar com cenas de Quick Time Event (bem comuns em jogos da Quantic Dream) e mecânicas novas. Uma delas é a de desenhar: enquanto na primeira temporada, como Max, você tira fotos, aqui o hobby do Sean é desenhar, e você faz isso observando os cenários e criando do rascunho à arte final em seu sketchbook. Outra mecânica é poder "olhar ao redor" pra encontrar o Daniel quando ele se afasta de você, e de incluir ele em comentários e discussões quando vai interagir com alguns objetos.   

Outra coisa interessante em relação à narrativa é que, enquanto em Life is Strange 1 a história era sequencial (cada episódio correspondia a 1 dia na vida de Max e cia), aqui há avanços grandes no tempo.

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SMS de Life is Strange 2
Incentivando a pirataria rss
Bom, mas o que não muda de jeito nenhum entre um jogo e outro? Primeiramente, detalhes como SMS e diário (aqui, é o sketchbook com anotações) continuam importantíssimos como uma extensão da história. Você descobre mais sobre a relação do Sean com amigos, com a crush e com o pai, por exemplo, que o gameplay não vai mostrar. "Nada é o que parece" se mantém em alguns aspectos, como personagens que parecem uma coisa e, quando você vê, não eram nada daquilo! Poderes "sobrenaturais" também marcam presença (Daniel aparentemente tem telecinese). A trilha sonora, lógico, segue marcante (aliás, Jonathan Morali, o compositor de Lis 1, está de volta nesta trilha original).

Por último, o tema. Enquanto na primeira temporada, a história era sobre uma menina tendo uma última chance de se reconectar com a pessoa mais importante da vida dela ao manipular o tempo, em Life is Strange 2é sobre dois irmãos sobrevivendo em meio a um mundo inóspito e preconceituoso, mas bonito, experimentando os dois sabores desse paradoxo. O que as duas têm em comum é o que torna a franquia Life is Strange tão tocante: dramas humanos, relações entre pessoas e nossa capacidade de nos colocar no lugar delas ao fazer escolhas.

LIFE IS STRANGE 2: UM JOGO POLITIZADO


Cuidado, spoilers!

Primeiro, vamos trocar uma breve ideia sobre política. Não, não estou falando de algo raso como debate de Whatsapp sobre direita e esquerda. Se consideramos que é através da política que a gente consegue se organizar socialmente, política está em tudo. É impossível ser neutro a ela; no máximo, ter uma falsa noção de neutralidade. Falando de minorias sociais aí, o simples fato de uma travesti ir ao mercado da esquina comprar farinha já é um ato político. Um casal homossexual andar nas ruas de mãos dadas é um ato político. Uma família latina ganhar a vida num país acalorado pelo discurso de um presidenciável racista e xenófobo, também.

E é aí que quero chegar.

A história de Life is Strange 2 se passa no período da corrida eleitoral americana de 2016, em que Trump ganhava (ainda mais) a atenção do mundo com ideias absurdas sobre construção de muros para isolar imigrantes e seus constantes flertes com uma perigosa supremacia americana.

Há quem se afaste do jogo ao descobrir isso, mas, como eu disse, você foge de política, mas ela não pode fugir de você. Sean e Daniel são descendentes de mexicanos, e toda a jornada deles pelos cinco episódios do game vai ser cerceada pela xenofobia, que já mostra as asinhas no começo deste primeiro episódio e tem tudo a ver com a tal tragédia que os leva a partir para a estrada. Você vai ver o despreparo e a violência policial intimamente ligada ao preconceito contra imigrantes, a agressividade de "cidadãos de bem" brancos e racistas, e até o medo que Lyla demonstra nos SMS, sobre o cenário político americano, também na conversa citada lá atrás entre ela e Sean, sobre o perigo que latinos e asiáticos podem correr. Sim, Lyla é asiática, demonstrando quão focada na diversidade a DONTNOD está (no primeiro jogo, essa questão ficou mais por conta da dinâmica LGBT entre Max e Chloe). Isso, inclusive, foi estendido para a escalação de elenco: Sean é dublado por um argentino (Gonzalo Martin) e, a Lyla, por uma coreana (Mei Pak). (Curiosidade vapt-vupt: a Mei e a Hannah Telle, dubladora da Max, participaram de um comercial mega fofo e engraçado do Google. Assista aqui.) 

VIDA LONGA À LIFE IS STRANGE, VÉI


ALGUMAS REFERÊNCIAS À LIFE IS STRANGE 1


Cuidado com os spoilers!

Como você leu no começo deste texto, esta nova temporada segue a rota do final que você escolheu para Life is Strange 1. E, se você também leu meu primeiro texto sobre o jogo, sabe que eu havia escolhido sacrificar a Chloe, coisa que jamais terei coragem de fazer novamente. Como eu acompanho tudo o que sai da franquia, eu já sabia que teria que escolher um dos finais pra seguir em frente aqui, e, na esperança que terei até o final do quinto episódio de encontrar qualquer ligação à Max e Chloe juntas vivendo suas vidinhas em algum lugar dos Estados Unidos, escolhi o final de sacrificar a cidade.

Em determinado momento deste primeiro episódio de Life is Strange 2, Sean, Daniel e o novo amigo Brody resolvem tirar água do joelho em frente a um mirante de Arcadia Bay. Quando o carro para e aparecem aqueles pinheiros familiares, eu já sabia onde eles estavam. Chega a manteiga derreteu. No meu caso, derreteu de tristeza, porque lá está a cidade completamente destruída e abandonada, contrariando todos os programas de reconstrução americanos.


Como se não bastasse, tem também um memorial sobre as vítimas da tempestade:

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"Por todas as almas perdidas na tempestade de Arcadia Bay. o TEMPO não se esquecerá de vocês"
Como se não bastasse MAIS AINDA, a cena se encerra com a música-tema de Max e Chloe (a que também acompanha os créditos finais dos episódios da primeira temporada). É de cair o cu da bunda deprimida.

Se você escolheu sacrificar a Chloe, a cidade também aparece, mas obviamente habitada, plena e linda. De qualquer forma, o momento de Sean e Brody ali revela rimas narrativas nos diálogos que têm a ver com a situação da cidade e deles próprios. No meu caso, Brody aponta para Arcadia Bay devastada e diz "Isso aqui é passado, o seu futuro está ali no carro", se referindo ao Daniel e à integridade dos dois. "Não tem como voltar no tempo", também fazendo uma relação à história de Life is Strange 1: ela se encerrou, da maneira que o jogador quis, e é hora de seguir em frente (que é a moral do jogo), abraçando esta nova história.

Na cena seguinte, pra aliviar a angústia de nossos corações, a trupe estaciona em um motel com um nome curioso:


Three Seals? Two whales? PEGOU-PEGOU?

Por fim, QUAL O PROBLEMA DE LIFE IS STRANGE EM MATAR PAIS LEGAIS? (Isso não é nem uma referência, é uma pergunta desesperada mesmo.)


COLECIONÁVEIS E TROFÉUS


Vamos combinar, platinar Life is Strange 1é mamão com açúcar: basta colecionar todos os troféus, atrelados às fotos (os colecionáveis) que a Max tira, ou seja, basta tirar todas as fotos de todos os episódios. Nesta temporada nova, as coisas estão um pouco mais difíceis.

Primeiramente, ao invés de fotos, como colecionáveis você tem patches, chaveiros e "lembrancinhas" que o Sean coleta em diversos lugares ao longo de sua road trip. Os troféus, além de estarem atrelados a esses colecionáveis, também estão aos desenhos que você faz pelos episódios e à finalização deles. Então, para platinar o jogo, é necessário desenhar tudo o que tiver pra desenhar, pegar todas as lembrancinhas de estrada e, claro, concluir o game inteiro.


MEU VEREDICTO E EXPECTATIVAS


Eu adorei, sinceramente. Cheguei até a concluir, no calor do momento, que foi um primeiro episódio melhor que o primeiro de Life is Strange 1, mas acho que fica pau a pau: meio lento no desenvolvimento, com momentos de ação marcantes. A cena final foi bem tocante e cortadora de cebolas. Não me apeguei ao Sean como rapidamente me apeguei à Max, mas foi impressionante como curti o pai dele e a Lyla, que aparecem por pouco tempo, assim como o Brody, e estou completamente apaixonada pelo Daniel.


PROTEJAM ESSA CRIANÇA PELO AMOR DE DEEEEUUUUUUUS

Não vou nem mencionar a Cogumela (sem revelar muito sobre, pra não dar spoiler), que virou minha missão máxima nesse episódio e, quando vi que ela estava entre nós, corri em círculos gritando pela sala.

Sobre o que espero daqui pra frente, não tenho muito o que dizer. Espero uma escolha moral bem difícil em relação à promessa que o Sean faz pro Daniel no final, a aparição do Chris, CHLOE E MAX (rs), finais múltiplos e agridoces, os irmãos trabalhando em conjunto pra controlar a telecinésia e, claro, desdobramentos políticos sobre a xenofobia que já foi introduzida.

Se quiser saber mais, eu e dois amigos gravamos um programa sobre este episódio no nosso podcast de Life is Strange, a Rádio Shaka Brah, que deve ir ao ar na próxima semana. Ouça aqui. ;)

Assim que o próximo episódio do jogo lançar, provavelmente até dezembro, a gente se encontra de novo.


Nota:





A MALDIÇÃO DA RESIDÊNCIA HILL e os fantasmas que nos assombram


OBRIGADA, UNIVERSO, POR ESSES NOVOS FILMES E SÉRIES DE TERROR DECENTES


Obrigada, também, à Netflix, que acertou na produção de A maldição da residência Hill, nova série de terror que entrou no catálogo da plataforma em outubro e já tem feito uma galerinha se apaixonar. E, pasmem alguns, chorar – apesar da categorização já estar feita, a história é nos moldes daquele terror a la O orfanato do jeitinho que eu gosto, carregado de drama. Acho até que tem mais drama.

O diretor, Mike Flanagan, já fez seu nome no gênero terror assinando filmes como O espelho, Ouija: a origem do mal, Hush – a morte ouve, Jogo perigoso (esses últimos, na Netflix) e o ainda em pré-produção Doutor Sono, continuação de O iluminado. Embora eu tenha gostado de Hush e Jogo perigoso, com ressalvas, é nessa série que ele conquistou meu coração. Os dez episódios de A maldição da residência Hill contam a história da família Crain, que se muda para a tal residência Hill, conhecida como a casa mais mal-assombrada do país, a fim de venderem a casa depois de uma reforma por um preço bem mais alto e enfim poderem construir a "Casa Para Sempre" que a matriarca, arquiteta, projetou.

Seguindo outra coisa que muito me apetece – narrativa não linear –, esses episódios acompanham, cada um, a perspectiva de um membro da família, composta por marido, esposa e cinco filhos pequenos, intercalando os acontecimentos de quando todos moravam no casarão e dos status desses filhos, 26 anos depois de deixarem a casa. Na fase adulta, separados pelas famosas "coisas da vida", eles são obrigados a se reencontrarem devido a um acontecimento trágico.

Isso é muito bom para apresentar e desenvolver com calma os personagens e provocar empatia por cada um, que têm personalidades tão distintas e cativantes. A residência Hill é onde todos os cinco passaram uma pequena, mas significativa parte de sua infância, em que alguns pontos foram determinantes para as pessoas que se tornaram. E lá, claro, sim, por supuesto, é mal assombrado. Aí está o ponto terror:acompanhamos como as crianças lidam com os fenômenos sobrenaturais e espíritos que percorrem os cômodos, e como essas coisas os influenciam. Há jump scares (odeio, e, com certo orgulho, digo que caí em apenas um) e uma atmosfera constante sinistra na casa, com a ajuda de pouca trilha sonora, que merece ser chamada de personagem também. Em um dos episódios, alguém diz que ela funciona como um corpo humano; tem membros, pele e órgãos, e realmente parece que está viva. De tão enorme, parece engolir as pessoas que lá habitam, dona de um mal muito maior do que todos. 

O ponto drama está na relação entre essa família que, seja no passado ou presente, envolve proteção, amor, desentendimentos, diferenças e união. A maldição da residência Hill fala, sim, sobre uma casa repleta de espíritos, mas fala principalmente daquilo que nos assombra; nossos medos, e nossas escolhas. A série é, basicamente (e na minha opinião), uma história sobre lidar com o luto e com a morte.

Tirando uns problemas de ritmo, não tenho considerações negativas a fazer. Portanto, bora pra parte com spoilers, pequeno gafanhoto.


ENTENDO MELHOR OS PARANAUÊ DA SÉRIE



Assisti a todos os episódios de A maldição da residência Hill em menos de 12 horas, com pausas regulares para comer açaí e ir ao banheiro. Quem já leu outros textos aqui, sabe que não tenho educação pra ver série. Alucinada, no dia seguinte troquei ideia com minha consagrada amiga Áurea e, então, pude ter um panorama sobre a história inteira.

Pra começar, a residência Hill não é necessariamente má. Alguns espíritos são, realmente, maus, como a Poppy Hill, mas outros só querem transitar por ali em paz e, com isso, acabam assustando as pessoas. Se lembram da cena da imagem que abre esse texto? Pois é, basicamente "foca em outra coisa, que o fantasma segue a vida (rs) dele".

No entanto, Liv, a mãe-Crain, sensitiva, se deixou levar pela influência do maus espíritos, principalmente da Poppy – que já era insana enquanto viva e matou não só a filha não nascida do casal Dudley, como indiretamente matou Abigail (inclusive, pra mim, o fato de ela ser real é a maior surpresa da série) e queria os filhos dos Crain. Poppy a manipulava por meio de pesadelos, em que Liv via Nell e Luke mortos, a ponto de acreditar que o que estavam vivendo eram um sonho e, para acordar, era preciso "morrer". Para ela, fazer os filhos ficarem eternamente na casa seria uma forma de poupá-los de seu destino no "mundo real". Nisso, Hugh responde, no fim da série, que dessa forma eles não sentiriam nenhum mal ou dor, mas em compensação também não sentiriam nenhuma felicidade. Apenas o nada, indo ao encontro do que a Theo sentiu ao tocar o corpo da Nell no necrotério. Por isso, Hugh decide tirar a própria vida para ficar ao lado da esposa e da caçula e, ao mesmo tempo, libertar os outros filhos da casa. Como uma troca.

Fantasmas não têm noção de tempo, como bem "aprendi" no maravilhoso filme A ghost story. Vivem por gerações no mesmo lugar, sem entenderem quantos anos realmente se passaram. Por isso, transitam livremente entre passado, presente e futuro, o que explicaria a Nell criança ver a Nell adulta e morta (a "moça do pescoço torto") em diferentes momentos, como um déjà vu premonitório, assim como os rabiscos na parede de "(Well)Come home Nell", escritos muito antes.


O QUARTO VERMELHO



"Um fantasma pode ser várias coisas: um sonho, um segredo, luto, raiva, culpa. Na maioria das vezes, é algo que queremos ver."
O Quarto Vermelho era um dos maiores mistérios da história, e entendo, em parte, algumas pessoas terem ficado decepcionadas. Acho que eu mesma estava esperando uma versão do quarto secreto do Christian Grey com sangue e corpos, mas à medida que fui entendendo a conexão do quarto com tudo o que a série vinha mostrando, fez muito mais sentido ser um "quarto mágico".

O que eu entendi: o Quarto Vermelho é uma referência direta à essa citação que coloquei aí em cima, sobre o que seria um fantasma. Principalmente, no sentido figurado. Tanto é que, quando os cinco irmãos estão reunidos lá, cada um tem um confronta seus próprios fantasmas no bom e no mau sentido. Steven tem o desejo – aquilo que ele, em seu subconsciente, persegue – de reatar com a ex-esposa e construir uma família, mas leva vários tapas na cara sobre os erro que cometeu. O mesmo acontece com os outros: Shirley entendendo que, apesar de todo o controle que tenta exercer sobre si e sobre as pessoas, precisa enfrentar a traição que cometeu no passado; Luke dividido entre o amor que sente pela coleguinha da rehab e a vontade de largar o vício; Theo querendo dar o braço a torcer e finalmente se doar num relacionamento (e, como toda boa sapatão, se casar com a mulher que encontrou na boate na noite anterior).

O momento em que eles decidem encarar a vida de frente é quando Nell decide "acordá-los". Aqui, entra uma outra teoria de que cada irmão representa uma fase do luto, na ordem de seus nascimentos. Steven seria a negação (ele nega que o que aconteceu na casa seja real/sobrenatural), Shirley seria a raiva, Theo a barganha, Luke a depressão e, Nell, a aceitação. Justamente por ser a ultima fase do luto, que o papel dela nesse momento do Quarto Vermelho seria tão importante.

Toda a cena foi uma das que mais me emocionou na finale (fora o casal Dudley retornando à casa depois de anos para morrer lá e viver eternamente com as filhas). Inclusive me lembrou bastante a segunda parte de IT – A Coisa (o livro, o livro), em que os amigos adultos retornam à Derry pra enfrentar Pennywise e precisam encarar seus maiores medos pra derrotá-lo.


EASTER EGGS FANTASMAGÓRICOS 


O diretor de A maldição da residência Hill falou, em uma das entrevistas, que cada episódio "escondia" fantasmas em determinadas cenas.   

A bonita aqui não encontrou nenhum porque: 1) Fotografia escura 2) Ou eu lia a legenda, ou olhava pros cantos da cena 3) Não queria encontrar mesmo não, fralda já tava cheia. Mas trouxe alguns exemplos de prints que uma alma (rss) caridosa do Dias de Cinefilia publicou:












ROSTINHOS CONHECIDOS


Eita cast abençoado. Mike Flanagan, esperto que só, convidou para participar de A maldição da residência Hill muitos atores com os quais já trabalhou. Além disso, há mais gente conhecida que alguns podem nem fazer a relação:


Carla Gugino, a sugar mommy Liv, em Jogo perigoso (baseado em quem? Livro de papai Stephen King).


Kate Siegel, a Theo, em Hush – A morte ouve.


HELLA YES, Henry Thomas, o Hugh, é o menino Elliot de E.T – O extraterrestre, o clássico da nossa infância (pelo menos da minha).


Lulu Wilson, a Shirley criança (que, morena e de lentes escuras, está assombrosamente (rs) parecida com sua versão adulta), já fez Ouija: a origem do mal, Annabelle 2: a criação do mal (nossa, que nomes criativos) e foi a Marian no maravilhoso Objetos cortantes. Princesinha do terror e do suspense.


Por fim, Elizabeth Reaser, a Shirley adulta, foi a mamãe Cullen na franquia-bomba Crepúsculo, que sempre assisto quando está passando na TV, que minha terapeuta explique.

No mais, é isso. A maldição da residência Hill segue bem recomendada, e eu me despeço aqui dizendo que todo mundo vai morrer um dia. Mas, até lá, continuamos sendo seres que vivemos muito melhor perto de quem a gente ama. Sei lá, anotem isso.

"O medo é  o abandono da lógica (...) Mas, ao que parece, o amor também. O amor é o abandono da lógica. O abandono voluntário dos padrões racionais. Nós cedemos a ele ou o combatemos. Mas não vivemos sem ele. Eu amei vocês. E vocês me amaram. Profundamente. O resto é...confete".



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